Educación
Asignaturas enfrentadas en busca de espacio
Jurjo Torres Santomé
Cuadernos de Pedagogía
Nº 456, Sección Historias mínimas, Mayo 2015, pág. 8
La educación crítica en una organización de estudios disciplinar puede convertirse en mantra cuando falta interacción con contenidos de otras áreas de conocimiento, lo que dificulta el ejercicio de la crítica. Cuanto mayor bagaje cultural procedente de otras disciplinas podamos poner en interacción más amplitud alcanzaremos en las miradas.
El mundo académico fue capaz de organizar más de ocho mil disciplinas, cuya existencia suele depender de la detentación de espacios de exclusividad, sin diálogos entre sí, mirando de reojo a quien pretenda disputarlos. Este reduccionismo disciplinar ocasiona un egocentrismo intelectual; lo propio se ve como ámbito totalizante, autosuficiente; dificulta asumir la complejidad del mundo. Las disciplinas disciplinan nuestras miradas y facilitan que se ignore qué dicen y cómo operan sobre la realidad otros campos de conocimiento. Esta fragmentación ampara una presumible neutralidad tecnocrática de la ciencia.
Una de las quejas constantes del alumnado es la falta de relevancia de los contenidos escolares. Algo que, a su vez, obliga a sacar a la luz como mínimo dos tipos de razones. Una es la excesiva fragmentación del conocimiento, derivado de una tradición y hegemonía positivista que incide en su significatividad. Otra, el tipo de tareas escolares y prácticas que son viables cuando la mirada se dirige sobre situaciones bastante artificiosas, dado lo limitado de la fracción de la realidad que posibilita la segmentación disciplinar.
Si asumimos que la realidad es compleja y multidimensional, es obvio que la motivación para su estudio, al menos en las etapas obligatorias del sistema educativo obliga a organizar los contenidos escolares de un modo que facilite la significatividad, que el alumnado capte desde el primer momento que estamos hablando de algo con posibilidades de suscitar su interés.
Urge ayudar al alumnado a aprender a ver la complejidad de la realidad y, por tanto, trabajar con currículos integrados para evitar reproducir un cierto «complejo de Tiresias» al que llevó la conquista de tantos especialismos.
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A imperiosa necessidade de uma teoria e prática pedagógica radical crítica:
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Diálogo com Jurjo Torres Santomé
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João M. Paraskeva. Universidade do Minho, Braga, Portugal
Luís Armando Gandin. Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, Brasil
Álvaro Moreira Hypolito. Universidade Federal de Pelotas, UFPel
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Curriculo sem Fronteiras
Vol. 4, nº 2, pp. 5 – 32, Jul.- Dez. 2004
Resumo
Entrevista com o professor Jurjo Torres Santomé, na qual ele discute o tema da educação, globalização e currículo, centrando sua análise na crítica ao pensamento conservador e neoliberal hegemônico no processo de reestruturação educacional em curso. Vários aspectos da realidade educacional espanhola e mundial são analisados, o que permite uma visão clara da sua compreensão acerca das principais temáticas do campo do currículo, envolvendo ensino, métodos, políticas educacionais, reformas educativas, globalização e neoliberalismo.
Abstract
Interview with Professor Jurjo Torres Santomé, in which he discusses issues related to education and curriculum and its relation to globalization. Santomé focuses his analysis on the critics of hegemonic, neo-conservative and neo-liberal educational restructuring. Several aspects of the educational context in Spain and throughout the world are analyzed, bringing a better understanding of curriculum, and themes such as teaching, methodology, educational policies, educational restructuring, globalization, and neoliberalism.
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Currículo sem Fronteiras – Você esteve profundamente ligado ao PSOE [Partido Socialista Operário Espanhol] e profundamente envolvido – na concepção e implementação – na reforma educativa na Espanha. Posteriormente, você se retirou e anunciou o rumo que a reforma viria a assumir. Quais as razões que o levaram a afastar-se de um projeto político importante, no qual esteve profundamente envolvido?
Jurjo Torres Santomé – Eu fui assessor do Ministério da Educação e Ciência nos dois primeiros governos do PSOE, apesar de nunca ter sido militante desse partido. Eu sempre me mantive mais à esquerda. Durante os anos em que estudei na Universidade de Salamanca, fui ativista num grupo nacionalista de ideologia comunista, na UPG (Unión do Povo Galego), que atualmente integra o BNG (Bloque Nacionalista Gallego), coligação que reúne diversos partidos e movimentos sociais nacionalistas da Galícia. A Galícia é uma das províncias que fazem parte da Espanha (juntamente com o País Basco e a Catalunha) e que reivindica maiores cotas de auto-governo no Estado Espanhol. Apesar de não ser atualmente militante de forma organizada, todos os que me conhecem sabem que simpatizo e apoio o BNG. No entanto, quando o PSOE foi eleito em 1982 para governar a Espanha, toda a esquerda concordou em apoiar a primeira experiência progressista no país depois da longa e cruel ditadura do General Francisco Franco Bahamonde. A minha colaboração enquadra-se na aposta da esquerda para democratizar um Estado que uns meses antes tinha sofrido um golpe de estado levado a cabo por um importante grupo de militares, mas que apenas durou algumas horas. Este golpe militar falhado viria a provar que a democracia era algo ainda muito débil. É nesta base que se enquadra o meu apoio ao Governo Socialista. O Ministério reuniu um conjunto de pessoas nas quais confiou a criação de uma lei nova para todo o sistema educativo. Pretendia-se a substituição da Lei Geral da Educação, que tinha sido promulgada em 1970 durante o Governo ditatorial do General Franco. O meu trabalho foi muito intenso, dado que colaboro no sentido de pôr em marcha diversos programas e iniciativas para ajudar os professores na defesa de uma educação pública com mais qualidade. Além disso, junto com outros colegas, entre eles, José Gimeno Sacristán, Angel Pérez Gómez, Alvaro Marchesi, César Coll, Jesús Palacios, fomos incumbidos de decidir como deveria ser a educação neste país, construir uma nova Lei. Durante duas legislaturas fomos criando o projeto de uma nova lei, a LOGSE (Lei Orgânica Geral do Sistema Educativo) que viria a ser aprovada em 1990. Eu colaborei ativamente com o Ministério da Educação desde 1989, altura em que o Projeto da Lei começou a ser debatido no Parlamento Espanhol. Nesses últimos quatro anos as minhas divergências aumentaram, pois havia programas que se iam atrasando sem justificações convincentes: programas dedicados a promover bibliotecas escolares e salas de aula, propostas para incentivar o uso de mais variedade de recursos didáticos nas escolas, relegando os livros escolares para um lugar mais secundário. Propus que os documentários que a Televisão Espanhola produzia e que por essa razão eram financiados com dinheiro público se distribuíssem em todas as escolas. Não entendo como é que qualquer pessoa pode ter acesso através da televisão a documentários sobre os rios da Espanha, os montes, a vegetação, obras de teatro representadas pelas melhores companhias de teatro, concertos de música, etc., financiados com dinheiro público e, por outro lado, nas escolas os mesmos temas são reduzidos nos livros escolares a quatro ou cinco linhas incompreensíveis. Pareceu-me que esta idéia era boa e com custos reduzidos, bastava gravar em fitas de vídeo, uma vez que os restantes custos de produção já tinham sido bancados pelo Estado. Também propus que se incentivasse a criação de bibliotecas temáticas de divulgação. Tratava-se de oferecer apoio econômico às editoras para publicar livros de divulgação científica de forma a que os alunos fossem entrando em contato com livros bem concebidos, bem escritos e documentados, elaborados por autênticos especialistas.
Logicamente este tipo de medida não era bem vista pelas principais editoras de livros. As pressões foram muito fortes e este tipo de proposta nunca foi avante, foi sendo adiada muitas vezes. Assim, nem sequer nos deixaram participar no modelo de programa. Curiosamente, José Gimeno, Angel Perez e eu (os três únicos pedagogos da equipe) fomos excluídos desse debate e os psicólogos do grupo optaram por recorrer a uma proposta muito mais tecnocrática, praticamente tyleriana, e inundaram o ambiente educativo com uma linguagem claramente psicóloga. Quando decidi abandonar o Ministério publiquei um artigo cujo título expressava claramente as minhas idéias sobre esses acontecimentos: “La Reforma educativa y la psicologización de los problemas sociales” (En VV. AA.: Sociedad, Cultura y Educación. Edit. Centro de Investigación y Documentación Educativa, Ministerio de Educación y Ciencia y Universidad Complutense de Madrid. Madrid, 1991, págs. 481- 503). Era como se a psicologia e mais concretamente o construtivismo, fosse a pedra filosofal que iria resolver todos os problemas do sistema educativo. Curiosamente deu-se um novo fenômeno: o Ministério deixou de fazer política educativa para se tornar numa espécie de Faculdade Universitária dedicada a incentivar e legitimar oficialmente o construtivismo psicológico. No entanto, o verdadeiro motivo que me levou a deixar de colaborar com o PSOE foi o fato de terem cometido um erro para o qual vínhamos a chamar à atenção durante anos: não houve nenhum compromisso oficial no sentido de financiar a nova Lei. Aprovar no Parlamento ou no Senado uma Lei sem um programa de financiamento concreto era como aprovar uma cortina de fumaça. Era claro que não havia dinheiro para a Educação e o pouco era gasto para os professores freqüentarem cursos acerca do construtivismo em psicologia. Mas, como me diziam alguns professores: o que fazer depois nas aulas com o construtivismo? Nem sequer se aproveitou para tentar alterar a formação base dos professores.
A LOGSE é uma lei que manteve a formação dos professores tal como estava. No fundo parecia que o Ministério pensava que bastava legislar para mudar a vida nas escolas. Em resumo, penso que a Espanha desperdiçou um momento decisivo em que todos estavam dispostos a colaborar e a ajudar. Nunca a esquerda esteve tão unida. A partir dessa altura, o ambiente foi piorando e o Partido Popular, à direita, chegou ao poder e lá continua.
Currículo sem Fronteiras – Ao nível da União Européia, a realidade tem demonstrado nos últimos anos, que as gestões socialistas e sociais democratas têm-se confundido, sobretudo nas áreas judicial, da saúde e da educação. Tomando como exemplo o caso da Espanha e no que diz respeito às políticas educativas e curriculares, que paralelismos poderia estabelecer entre o período de governo socialista e o período atual liderado pelo Partido Popular?
Jurjo Torres Santomé – Sou dos que pensa que na Europa ainda há diferenças entre social democratas e socialistas e os conservadores e neoliberais dos partidos de direita. No entanto, os primeiros confiam no Estado e lutam por consolidar o Estado do Bem Estar. Ainda existe uma forte idéia de Estado como garantia de serviços tais como saúde, educação, seguridade social, aposentadoria, habitação, serviços sociais para a terceira idade, etc. Isto é mais visível nos países nórdicos. No sul, onde este estado de Bem Estar foi sempre fraco, como, por exemplo, em Portugal e na Espanha (entre outras razões, devido aos grandes períodos de ditaduras militares a que ambos estiveram sujeitos), as políticas para abandonar o passado e passar a reger-se por completo pelo mercado são mais claras nos partidos de direita. Contudo, nas últimas décadas tem de se reconhecer que os partidos socialistas e social-democratas têm adotado cada vez mais políticas neoliberais. O caso mais visível é o do Reino Unido em que a Terceira Via dos trabalhistas de Tony Blair quase se transformou num estratagema lingü.stico para encobrir as políticas econômicas neoliberais. Uma coisa preocupante é a obsessão que tem, por exemplo, na Espanha, o PSOE para atrair os votos da direita. Isto leva ao abandono de tudo o que eram os seus símbolos identificadores, cedendo na luta pelos grandes ideais para atrair uma direita capitalista que o levará a tomar atitudes pouco claras, levando a que população vote à direita, pois é a única leitura clara e sem ambigüidades que consegue fazer. Vivemos num mundo onde a direita controla os meios de produção e em especial, os meios de comunicação, algo em que até há pouco tempo a esquerda era mais poderosa.
Não há muitos anos a esquerda tinha mais facilidade de divulgar as suas mensagens, de promover debates intelectuais importantes com idéias e propostas de ação. Atualmente, um dos grandes problemas da esquerda é o acesso à televisão, ao rádio e à imprensa. A direita aprendeu a controlar habilmente estes meios e existem muitas pessoas que acreditam que não existem nem discursos nem modelos alternativos. Obviamente estão fortemente censurados. Os social-democratas parecem entrar nesse jogo. A direita deixa-lhes pouco espaço para aparecerem nos grandes meios de comunicação social, no entanto exige contrapartidas: exige-lhes que baixem o valor das suas propostas. Assim, por exemplo, na Espanha o PSOE tem apenas um jornal ao seu serviço, o “El País” (de grande tiragem e muito êxito); no entanto este jornal não aceita um pensamento mais à esquerda. Assim, qualquer analista de imprensa estrangeiro poderia constatar que na Espanha não existe Esquerda Unida (uma coligação em que está integrado, entre outros, o Partido Comunista) ou o Bloco Nacionalista Galego, apesar de serem coligações com representação no Parlamento e no Senado. Esta censura vai aumentado se, para além de se ser de esquerda, for “nacionalista de esquerda”. Aqui a manipulação passa a ser escandalosa, pois o discurso oficial tanto da direita espanhola como do Partido Socialista é tão manipulador que apresentam os nacionalistas de esquerda como se tratassem de nazistas (o Partido Popular, que na realidade é ultranacionalista, ou seja, tem um discurso fortemente nacionalista e conservador só que com outras fronteiras, as do Estado Espanhol. Analise-se a política de imigração que é defendida pelos partidos que dizem que não são nacionalistas e veja-se como é que se explica a notícia sobre o direito de admissão de trabalhadores de outros países). Nada mais longe da realidade. Eu considero-me nacionalista de esquerda e toda a minha vida tenho lutado contra as idéias e práticas da direita e contra algumas da esquerda espanhola; não me sinto de forma alguma representado pela imagem oficial que se tem da cidadania do que é o nacionalismo e em concreto do nacionalismo de esquerda.
Currículo Sem Fronteiras – No artigo “Democracia, Instituições Escolares. Diversidade e Justiça Social” você defende a educação como uma dimensão da política cultural de uma determinada sociedade, não só destacando que as questões curriculares devem ser consideradas no âmbito mais amplo da política cultural, como também denunciando toda a proposta curricular como a resultante de opções entre distintas parcelas da realidade. Assim, e uma vez que o currículo, na seqüência do que nos propõe também Forquin, expressa o resultado de uma intencional seleção no seio de uma dada cultura, como será possível efetuar esta seleção por forma a que se promova a justiça e igualdade sociais, numa época em que, mercê das políticas neoliberais, se assiste cada vez mais, à cristalização do espectro da segregação.
Jurjo Torres Santomé – Penso que a segregação é um dos grandes problemas do século que agora se inicia, o século XXI. Pode-se afirmar que este problema sempre existiu, no entanto atualmente está a aumentar devido aos modelos econômicos neoliberais que dominam este mundo globalizado. Se há algumas décadas se dizia que no mundo existiam países em vias de desenvolvimento, também se acreditava que se uma vez desenvolvidos continuariam nesse grupo para sempre. Hoje em dia aquilo que se constata é que são cada vez mais os países em vias de subdesenvolvimento, ou seja, países que tinham entrado em pleno a competir de igual a igual no mercado dos países desenvolvidos, agora sofrem crises constantes, países com economias na bancarrota e com condições de vida semelhantes às dos países mais pobres do mundo. Um bom exemplo é o caso da Argentina. Quem iria imaginar há 30 anos que um dos países mais cultos e ricos como era a Argentina chegaria à situação grave em que se encontra hoje em dia? Ninguém. No mundo da economia observase que dia após dia toda a riqueza e os recursos estão mais concentrados. Basta consultar o ranking das pessoas mais ricas do mundo que a revista Forbes publica periodicamente. Um autêntico escândalo! A segregação vai aumentando, embora em muitas alturas até chegue a dissimular-se. Pensemos como nos últimos anos apareceu um fenômeno completamente novo: a “pobreza vergonhosa”, ou seja, um grupo de pessoas que não nasceram em famílias pobres, tendo pelo contrário, nascido em famílias da classe média e até classe alta, que fizeram parte dessas classes durante muitos anos e que fracassaram na profissão chegando até à pobreza. Essas pessoas tentam esconder de todas as formas, gastando inclusivamente o pouco dinheiro de que dispõem em roupa e objetos para dissimular e ocultar assim a sua pobreza. Porque é que não se unem, protestam e lutam por outro tipo de sociedade e de mundo? Isto acontece essencialmente porque os discursos dominantes convenceram-nos, não só a eles como a uma grande parte da população, de que vivemos em sociedades em que já existe igualdade de oportunidades, por conseguinte agora as diferenças sociais são fruto de esforços individuais, do valor individual ou inclusive, dos genes. Ninguém é responsável por esses fracassos individuais, só cada um deles individualmente considerados. É terrível! Logicamente, na construção desses discursos, a escola também tem algumas responsabilidades, é óbvio que não as principais, mas desempenha um papel importante no desenvolvimento das pessoas para pensar, julgar e poder intervir em assuntos coletivos, públicos.
Há alguns anos tenho denunciado a degradação dos conteúdos dos livros didáticos. Contudo, continuam a existir demasiados temas que não são objeto de atenção nos conteúdos lecionados nas aulas. No entanto nas análises de matérias curriculares que faço periodicamente, as escolas continuam a pensar que no mundo só existem homens de raça branca, de idade adulta, que vivem em cidades, empregadas, cristãos, de classe média, heterossexuais, elegantes, saudáveis e robustos. Dificilmente nos conteúdos de tais livros se encontra informação sobre temas como: a vida quotidiana das mulheres, das raparigas, rapazes e adolescentes: sobre a situação das etnias oprimidas e os porquês das suas condições de vida; o que acontece às culturas das nações sem Estado? Por que as reprimem e tentam exterminar os seus idiomas e as obrigam a aceitar as línguas e culturas dos países hegemônicos? O que é que se ensina aos alunos sobre a vida das pessoas desempregadas, sem trabalho, sobre as injustiças que sofrem as pessoas no seu trabalho, sobre como podem defender-se? Que formulas de organização dos trabalhadores se ensinam para lutar por outras formas de produção e distribuição mais justas e democráticas? Como se explica a pobreza e por que aparece? Onde e quando se estuda a vida quotidiana das pessoas que vivem da agricultura e da pesca; as injustiças que enfrentam, a escassez de recursos de que dispõem devido à sua concentração exclusivamente nas cidades? Como podem defender-se e com o quê, os trabalhadores com baixos salários e suportando más condições de trabalho? Por que é que a vida das pessoas com menos capacidades físicas e/ou psíquicas é tão dolorosa e injusta? Como é que se explica que além de pessoas heterossexuais existem gays e lésbicas? Como se explicam as injustiças e situações de marginalidade dos homossexuais? Como se estuda a situação das pessoas idosas e doentes? Que idéias acerca do ser humano e do mundo são as mais acertadas e dignas? Que dizer sobre as religiões não cristãs ou das explicações atéias acerca do mundo?
Não é justo que os alunos durante a escolaridade obrigatória não cheguem a conhecer e refletir sobre as relações de poder existentes nas sociedades em que vivem esses grupos que sofrem de alguma forma de marginalização, a classificação, o seu valor e os motivos pelos quais apareceram essas situações de marginalidade no mundo em que vivemos.
Tenhamos presente a luta das mulheres, dos grupos étnicos sem poder, dos povos sem estado, dos gays e lésbicas, etc., que deram relevo através do seu poderoso ponto de vista na definição do que vinha a considerar o conhecimento válido e necessário, a grande desigualdade de oportunidades e, como tal, as situações de injustiça a que estavam sujeitas as pessoas que faziam parte desses grupos. Uma escola comprometida com a justiça social e a liberdade tem de incluir estes ternas como conteúdos dos programas para os estudantes. É obrigatório se queremos formar cidadãos, ou seja, pessoas com informação e competências para analisar e avaliar a vida quotidiana não só da sua comunidade como a de dos povos mais distantes. Uma escola em que a escolha das matérias dadas oculte ou altere as condições de vida de grupos silenciados será uma escola opressora, injusta e colonizadora. É tudo o contrário da razão de ser desta instituição.
Currículo Sem Fronteiras – Num outro trabalho “As culturas negadas e silenciadas no Currículo” você, entre outras questões cruciais, denuncia o currículo como um mecanismo de constante desvalorização de determinados quadros culturais, alertando para a necessidade de perceber a perigosa tensão entre os valores que preparam as pessoas para a cidadania e para o mundo do trabalho. Você acha que a temática da cidadania tem sido educativa e curricularmente bem tratada, ou tem sido apenas mais uma mera estratégia política construída em redor de um significado flutuante?
Jurjo Torres Santomé – Efetivamente, parecem-me muito preocupantes os silêncios e desvalorizações, a maioria das vezes conseguidas recorrendo a subterfúgios, de muitos grupos sociais que estão mais longe dos grupos sociais com maiores possibilidades de acesso a estruturas de poder e com maiores fontes de poder nas suas mãos. Esta situação agrava-se nas sociedades neoliberais, onde o mercantilismo a que submetem o sistema educativo leva a que determinadas matérias escolares sejam vistas como pouco interessantes, pois não são exigidas pelas empresas no mercado de trabalho. Os mercados fomentam o espírito empreendedor, mas não estão interessados numa cidadania preocupada com assuntos como a justiça e as responsabilidades sociais. As pessoas apenas são importantes como consumidoras, não como cidadãs. A cidadania que sempre se preocupou em conseguir mais justiça social e igualdade de oportunidades agora pode ser substituída pelos consumidores que apenas se regem pelas leis do mercado: a sua preocupação é ter liberdade para escolher e competir. Esta diferença de filosofias é o que explica que uma grande percentagem de pessoas pertencentes às novas classes médias já não se preocupam tanto com a política social, nem pela democratização da educação, nem por novos modelos educativos mais próximos das idiossincrasias dos alunos. A sua obsessão é que nas escolas os seus filhos obtenham boas notas sem nunca chumbar1 durante o curso e, se possível, que os convertam e transformem em pessoas obedientes à autoridade.
Não podemos esquecer que as escolas são um dos locais em que a sociedade delega a tarefa de socializar as novas gerações; o que significa ajudá-los a entender as condutas, tipos de inter-relação, formas de trabalho, estratégias de raciocínio, os juízos e valores que explicam o modo de ser das pessoas que fazem parte da sociedade em que os alunos são parte integrante, assim como as outras comunidades diferentes. Este processo, por sua vez, tem de servir para desenvolver todo um tipo de destrezas e valores que lhes permitam integrar-se como cidadãos na sociedade, de uma forma reflexiva e crítica. Uma missão tão importante implica, entre outras coisas, dedicar atenção às matérias culturais que se selecionam para atingir tais objetivos.
Este debate sobre a cultura escolar é um dos que pode suscitar as polêmicas mais comuns. Há muito tempo que os analistas do programa oculto e explícito têm trazido à luz enormes contradições nos valores que a escola promove sobre os diferentes modelos de vida e os produtos culturais mais importantes gerados pela sociedade, sobre o mais valioso da herança cultural. No decorrer da análise realizada pelo Ministério da Educação para a seleção cultural com o objetivo de impor conteúdos obrigatórios às escolas é fácil concluir que determinados grupos sociais fiquem melhor preparados do que outros, em relação a artefatos culturais, tecnológicos e científicos produzidos pelos grupos mais elitistas que são considerados os mais importantes. São as posições de poder e privilégio que detêm determinados grupos sociais que têm por hábito explanar muitos dos conteúdos culturais escolhidos como obrigatórios para as aulas.
Mas, apesar da intenção de controlar a cultura e de modificar os conteúdos para os apresentar como neutros, desinteressados, à margem da política, nas últimas décadas, mostrou-se na nossa sociedade um grande consenso acerca de determinadas tarefas e conteúdos que deveriam fazer parte do programa escolar. Assistimos a como as escolas dia após dia enfrentam as novas propostas da sociedade. Além de lhes exigir um aumento do nível cultural das novas gerações, atribuiu-se-lhes o incremento do desporto, de hábitos pessoais saudáveis, de educar para o ócio e tempo livre, de ensinar uma alimentação saudável, persistiram muito mais na informação acerca do comportamento cívico. Até a pouco tempo, a maioria das pessoas considerava estes assuntos uma obrigação exclusiva das famílias, porém hoje em dia existe legislação para que também sejam tarefas obrigatórias das escolas. Os nomes das matérias transversais são um bom exemplo desta nova extensão do significado e da missão das instituições escolares: “educação para a saúde e qualidade de vida”, “educação moral e cívica”, “educação sexual”, “educação ambiental”, “educação para a paz”, “educação do consumidor”, “educação para a igualdade de oportunidades entre os sexos”, “educação para o ócio”, “educação para a vida”.
No entanto, os últimos anos de governo do Partido Popular na Espanha, e em particular com a promulgação da Lei Orgânica de Qualidade da Educação (Dezembro de 2002), os resultados estão a ser notáveis. Assim, por exemplo, uma das ausências preocupantes no programa proposto pela Administração (outra coisa é o que as escolas ensinam na realidade) é o abandono do que se tem denominado, a “Educação cívica ou da cidadania”. Algo que obrigaria os alunos a lidar com temas que se consideram imprescindíveis para poderem exercer os seus direitos e deveres como cidadãos. Temas, entre outros, como a justiça social, o desenvolvimento sustentável, a interdependência e globalização, os direitos humanos e responsabilidades sociais permitiriam aos alunos analisar valores e atitudes, ajudá-los-iam a questionar e explorar as suas próprias concepções do mundo e as que são mais dominantes na sua comunidade e em outras partes do mundo. Poderiam vir a conhecer as interdependências que existem nos produtos com que se alimentam, vestem, se informam e se divertem, e as formas de vida que têm outros povos que, em alguns casos, fabricam esses produtos e, noutros casos, não lhes têm acesso.
É óbvio que estes conjuntos de conteúdos estão dispersos num programa curricular, mas também se constata que grande parte dos cidadãos queixa-se que os jovens não estão informados, nem se comportam como deveriam em tudo o que diz respeito aos seus deveres e obrigações cívicas. A educação transversal que promovia a anterior lei promovida pelo Governo Socialista, a LOGSE (Lei Orgânica Geral do Sistema Educativo, Outubro de 1990), marcou um avanço neste caminho. Os seus resultados práticos ainda não estão suficientemente avaliados, mas podemos comprovar que nos projetos curriculares dos centros e das aulas elaborados pelos professores é dedicado um capítulo exclusivamente a este tipo de temáticas.
Obviamente, conscientizar os alunos e, até os professores de que seria necessário tornar mais visível a realidade nos conjuntos temáticos de que se compõem as matérias que são distribuídas nas aulas (razão pela qual a LOGSE integra a educação transversal), originou situações que não eram do agrado do Governo do Partido Popular. As escolas que sabem que têm obrigatoriamente que trabalhar de uma forma transversal matérias como “Educação para a paz”, “Educação moral e cívica” ou “Educação ambiental”, viram-se obrigadas a canalizar a sua atenção para problemas atuais, como o desastre ecológico na Galícia e todo o norte da Espanha devido à maré negra do petroleiro Prestige, bem como a guerra com o Iraque. Estes dois temas foram vistos como uma ameaça ou um absurdo por parte do Governo conservador de Manuel Fraga Iribarne na Galícia, o que deu lugar à promulgação das “Instruções da Direcção Geral para as Escolas e Preceitos Educativos” (12 de Março de 2003) na tentativa de impedir que estes temas se tratassem nas como conteúdos transversais.
Estas “instruções” servem para intimidar a maioria das escolas, dado que estes dois temas estavam a ser objeto de uma imensa atenção, tanto por parte dos alunos como dos professores. Advertem-se as direções das escolas para que não utilizem locais de anúncios e outras instalações para fins que a Administração apelida de propangandísticos e publicitários. No meu país, Galícia, os dias que se seguiram à divulgação destas instruções foram dedicados pelas escolas ao debate sobre o que fazer com os trabalhos realizados acerca do desastre ecológico do Prestige e da guerra com o Iraque. A conclusão unânime, por aquilo que pude constatar, foi de que iriam continuar com este tipo de tarefas escolares e não iriam ter em conta as ameaças de sanções da parte do Ministério da Educação da Junta da Galícia, dado que se correspondem, pelo menos, com os conteúdos de três das matérias transversais que devem ser lecionandas obrigatoriamente: a “educação ambiental”, a “educação para a paz” e a “educação moral e cívica”. Esta situação de conflito com a Administração é uma boa amostra das intenções dos grupos conservadores que integram o governo do Partido Popular para controlar o conhecimento que se produz e circula nas escolas.
O avanço do neoliberalismo com intenção de criar pessoas consumidoras e não cidadãos, juntamente com a aliança com os grupos sociais mais conservadores preocupados em conformar seres humanos submissos e pouco críticos, militantemente convencidos com verdades que nunca se atrevem a questionar nem a debater, é algo que nos deveria levar a um verdadeiro debate democrático acerca dos conteúdos escolares que são objeto de estudo nas escolas e bem como as próprias metodologias.
Currículo Sem Fronteiras – O currículo nacional, construído com o intuito de atenuar a desigualdade social, viria a tomar-se num currículo fundamentalista, isto para usar sua própria terminologia. Desgastado como solução política, várias vozes têm tentado promover uma outra plataforma curricular, ornamentando-a com significados outros, nomeadamente, o currículo integrado. Seguindo a sua concepção teórica [e ainda de outros autores e autoras, como Beane, Apple, Ladson-Billings, Greene], que, de todo, não é a dominante, o currículo integrado é de fato a melhor maneira de se “fazer currículo”. Todavia, e é esta a nossa preocupação, você não acha que o debate em torno da integração curricular tem sido colocado de uma forma viciada, uma vez que acontece nos limites impostos pela ditadura disciplinar e algum [embora porventura compreensível] corporativismo da classe docente?
Jurjo Torres Santomé – Se existe uma crítica comum e reiterada ao longo da história do ensino, é a de selecionar, organizar e trabalhar com conteúdos culturais pouco relevantes, de forma nada motivadora para os alunos, correndo mesmo o risco de perder o contato com a realidade. Nesse modelo, as situações e problemas da vida quotidiana, as preocupações pessoais, acabam normalmente por ficar à margem dos conteúdos e processos educativos, fora dos muros das aulas e escolas. Por mais de uma ocasião é normal que o programa tradicional por disciplinas acabe apresentando uma semelhança notável com alguns jogos ou concursos de televisão de sentido nominalista, como, por exemplo, o jogo “Trivial Pursuit”; ou seja, considera-se aprender por se ser capaz de recordar pequenos fragmentos de informação sem entrar em pormenor e, mais grave ainda, sem uma verdadeira compreensão desses conteúdos que se verbalizam. Por exemplo, uma pessoa que diz que o Dom Quixote foi escrito por Cervantes dá a sensação de que tem conhecimentos de literatura, num concurso de televisão até receberiam um prêmio pela resposta à pergunta de quem escreveu Dom Quixote. No entanto, é muito provável que nunca sequer o tenham lido, que não entendam o verdadeiro sentido da maioria das situações que ali são narradas, que não saibam qual a época em que vive e escreve Cervantes, o que estava a suceder naquela sociedade, quais os motivos que levaram o autor a escrevê-la, de que forma influenciou a literatura a partir daí, qual o interesse atual desta obra, etc. Uma análise deste tipo obriga-nos a recorrer a muitas outras informações que são objeto de outras disciplinas. Para fazer frente a esta classe de problemas escolares durante todo o século XX foram criadas diversas estratégias didáticas. Soluções que têm como finalidade tentar converter os conteúdos culturais da escola de forma relevante e significativa.
Convém não esquecer de uma das perguntas mais freqüentes feitas pelos alunos aos professores: por que temos de estudar esta cadeira ou este tema? E a resposta mais freqüente do professor costuma ser, adotar uma atitude de transcendência e importância, dizendo que esse tema é importantíssimo para que no curso seguinte o possam entender como qualquer outro tema. Normalmente, serve sempre para o “próximo curso”, nunca para compreender qualquer situação atual ou um fenômeno do presente. Normalmente costumo dizer que o programa curricular se parece com os romances policiais de Agatha Christie. Todo um conjunto de informações com a finalidade de no final da escolaridade tenham sentido e se vejam as suas inter-relações. Nos romances de Agatha Christie com, por exemplo, 200 páginas, passa-se as primeiras 195 páginas fornecendo pistas, sem nunca as percebermos claramente. Sempre nos enganamos no diagnóstico, aquela pessoa que parece ser o assassino é na realidade boa pessoa. O assassino aparece nas últimas cinco páginas e é sempre uma surpresa, sendo nestas páginas que toda a informação anterior passa a fazer sentido. A minha pergunta é: onde estão essas cinco últimas páginas no processo da escolaridade obrigatória? Quando e em que momentos é que o aluno capta a relação que existe entre as diversas disciplinas que tem de estudar? E especialmente, quando se vê obrigado a integrar esses conteúdos oferecidos como peças de um puzzle na tentativa de cobrar plena consciência do quadro que compõem? Desde a minha experiência, penso que unicamente quando trabalham com modelos mais interdisciplinares, mais integrados.
Pensemos que a interdisciplinaridade é um dos conceitos que servem para justificar com maior contundência o programa integrado. Ou seja, a reorganização dos conteúdos, umas vezes para recuperar e outras para construir uma rede mais integrada entre conceitos e modelos e estratégias de investigação que uma subespecialização organizou em compartimentos estanques, não apenas com possibilidades de comunicação, mesmo quando tenham como finalidade analisar e intervir num espaço comum, com os mesmos objetos e/ou pessoas, um fim semelhante, etc. Tenhamos presente que a cultura das especificidades cria numerosos problemas à própria sociedade, pois é comum que diante de algum problema social, industrial, econômico, etc. diferentes disciplinas ofereçam soluções completamente distintas e, inclusivamente, contraditórias. Aquilo que na realidade acontece nessas ocasiões é que cada uma dessas disciplinas toma em consideração determinadas variáveis e ignora e despreocupa-se com outras. Um destes exemplos é o que acontece quando uma comunidade tenta obter mais energia, dependendo dos especialistas a consultar assim serão as propostas. É provável que os profissionais da física optem pela construção de plantas de energia nuclear, enquanto os que têm uma formação com maior peso da biologia, da sociologia, a filosofia etc., é mais provável que se decidam por propostas de intervenção muito diferentes, opondo-se com múltiplos argumentos às soluções dos anteriores. Podemos afirmar que as disciplinas “disciplinam” a forma como se interpreta, ou seja, só nos permitem observar e tomar em consideração a realidade com os conceitos, com as informações, com os conteúdos dessa disciplina que estudamos ou em que somos especialistas. Pensemos nas pessoas com o curso universitário concluído, por exemplo, sociólogas, economistas, psicólogas, físicas, etc. Ou seja, as pessoas que conseguiram concluir e ter êxito no sistema educativo. Quantas vezes nas conversas em que participam especialistas não escutamos reprovações do tipo: Claro, como tu és economista, tudo se resolve com a economia! ou és mesmo psicólogo, pois reduzes tudo a problemas interpessoais, questões de percepção, prejuízos, complexos, …! Frases semelhantes, o que fazem é chamar à atenção para o importante ponto de vista das nossas observações e análises.
Uma estratégia que pode contribuir para resolver problemas semelhantes é a criação de hábitos intelectuais nas pessoas, desde o primeiro momento de sua escolarização, para que se tome sempre em consideração o maior número possível de perspectivas quando se analisa, avalia ou intervém em qualquer situação ou resolução de qualquer problema. É óbvio que não podemos ignorar que esta divisão que domina o pensamento e a forma de atuar da maioria das pessoas que estão ou já passaram pelo sistema educativo não é unicamente resultado de subespecializações científicas e culturais, mas também conseqüência de modelos políticos que incentivam uma exploração de recursos naturais e a exploração econômica, cultural e, numa só palavra, o domínio de umas pessoas sobre outras.
Como conseqüência, falar de interdisciplinaridade é observar as aulas, o trabalho curricular do ponto de vista dos conteúdos culturais, ou seja, investigar quais as relações e os grupos de conteúdos que podem ser postos em prática, por temas, por conjuntos de conteúdos, por áreas de conhecimento e experiência, etc. Conseqüentemente, o programa integrado, é o resultado de uma filosofia sociopolítica e de uma estratégia didática. Tem como fundamento uma concepção do que é a socialização das novas gerações, o sonho de um ideal de sociedade, do sentido e do valor do conhecimento e, para além disso, do como se podem facilitar os processos de ensino e aprendizagem. Não nos esqueçamos que as questões curriculares são uma dimensão diferente, mais à imagem de um projeto de maiores dimensões de cada uma das sociedades, como é exemplo a política cultural. Qualquer proposta curricular implica opções sobre parcelas da realidade, partindo da idéia de seleção cultural que se oferece às novas gerações de forma a facilitar a sua socialização: com o intuito de os ajudar a compreender o mundo que os rodeia, conhecer a sua história, valores e utopias. O mesmo podemos concluir do programa curricular, o puzzle, nas palavras de Basil Bernstein, onde o parcelamento não é mais do que uma conseqüência da divisão e hierarquização da própria vida social. O programa é dividido em disciplinas ou temas, subdivididas então em grupos de conteúdos ou lições, em conteúdos, capacidades e valores; em trimestres, semestres, cursos acadêmicos e etapas educativas; o horário escolar é dividido em grupos rígidos que separam as atividades que deveriam ter maior continuidade: os professores subdividem-se em departamentos (a maioria das vezes de forma incoerente): o corpo docente isola-se da comunidade. etc.
Por outro lado, este tipo de divisões, são vistas como um dado adquirido, como algo que sempre foi assim e que não pode ser de outra forma; são questões que raras vezes são questionadas ou revistas, visto que não se assumem como algo que é assim porque algures, algumas pessoas que optaram por esta estrutura tiveram o poder suficiente para convencer os restantes profissionais de educação. E colocada de parte a análise dos interesses ideológicos, políticos e econômicos que estão por detrás da atual organização curricular do conhecimento, dos temas e conjuntos de conteúdos que são selecionados como foco de atenção para as aulas e centros de ensino.
O problema das escolas tradicionais, onde se dá uma forte ênfase aos conteúdos apresentados em pacotes de disciplinas, é que não acreditam que os alunos sejam capazes de ver esses conteúdos como parte do seu próprio mundo. Quando a física, a química, a história, a gramática, a educação física e as matemáticas não são visíveis para a maioria dos estudantes é fácil que tudo o que é ensinado nas aulas só se entenda como “estratégia” para os aborrecer ou, de uma forma mais otimista, ser o preço a pagar para que possam transitar de curso para curso com a esperança de obter uma licenciatura e depois logo se vê o que acontece. A instituição escolar aparece como o reino da artificialidade, um espaço em que existem umas normas particulares de comportamento, em que se fala de uma forma peculiar e em que não é necessário executar determinadas rotinas, que apenas servem para obter felicitações ou sanções por parte dos professores e, inclusive, das próprias famílias, mas não passa disso. Muitos estudantes chegam a assumir, levando em consideração a forma como levam a vida nas aulas, onde se torna muito difícil estabelecer uma interligação com a vida real, com os problemas e realidades mais quotidianas ou que isso apenas está reservado para as pessoas mais inteligentes, aos seres excepcionais. Desta forma, contribui-se para a continuação da mitificação do conhecimento, ocultando-se as condições da produção bem como as respectivas finalidades e perigos.
Não dar atenção a esta artificial compartimentalização que se estabelece entre a vida acadêmica e a vida exterior às escolas que pode até pôr em perigo o fim da escolaridade, em especial nos anos obrigatórios, ou seja, preparar os cidadãos para entender a realidade, a sua história, tradições e porquês e habilitá-los para intervir e melhorar a sociedade de uma forma democrática, responsável e solidária.
Uma das finalidades mais importantes que está na base de conceitos e modelos como o programa integrado é a preocupação de organizar os conteúdos culturais dos currículos de forma significativa, de tal forma que desde o primeiro momento o aluno compreenda o porquê das tarefas escolares em que se envolve.
O fato de se optar por estratégias integradas não significa que as disciplinas desapareçam, nem que deixem de fazer sentido as estruturas conceituais, as seqüências de conceitos e procedimentos nas planificações dos programas. No entanto, uma questão é essa estrutura disciplinar e outra é que na altura de as concretizar em propostas de trabalho para os alunos tem de se seguir essa mesma ordem que caracteriza a estrutura lógica dos conteúdos das disciplinas. Estas estão presentes nas idéias dos professores, mas as propostas curriculares que se conjugam regem-se por outra lógica, a de prestar também atenção à possibilidade ou não de se revelarem importantes e de interesse para os alunos. É necessário dar atenção aos conceitos, estruturas conceptuais e procedimentos que são indispensáveis para prosseguir em direção a maiores níveis de aprofundamento do conhecimento, que permitem enfrentar problemas cada vez mais complexos e avançar para níveis de maior domínio do conhecimento, dando atenção ao significado, relevância e interesse das tarefas escolares na perspectiva do estudante.
No trabalho curricular integrador a estratégia visível, o motor para a aprendizagem está estimulado por um determinado tema, tópico, ou centro de interesse que faz de eixo principal das necessidades individuais com as dimensões mais propedêuticas do sistema educativo, ou seja, com as condições para o acesso a outras etapas superiores do sistema escolar. Desde a preocupação com vertentes humanas, comunitárias, à preocupação com problemas sociais da atualidade e dos desafios da ciência e tecnologia como ajustar a funcionalidade e valor dos conteúdos culturais do programa, das teorias, conceitos, procedimentos e valores que se escolhem para trabalhar nas aulas.
Por conseguinte, um bom método de ensino integrado é muito mais do que a aplicação de uma determinada metodologia ou uma técnica. Pelo contrário, supõe-se não perder de vista as razões pelas quais se adota esta modalidade de trabalho curricular. Isso explica a preocupação dos professores que optam por esta filosofia pedagógica para criar condições, ambientes em que o aluno se sinta motivado para investigar, questionar e aprender. O desenvolvimento da inteligência, afetividade, sensibilidade, motricidade está condicionado pelas oportunidades de executar, envolver os alunos em questões como a resolução de problemas, planificação, desenvolvimento e avaliação de projetos de trabalho, estudo de casos sobre questões de conflito ou críticas, etc.
Currículo Sem Fronteiras – Num outro trabalho “Sem muros na sala de aula: o currículo integrado”, Jurjo defende que o currículo integrado implica uma proposta de trabalho coerente, tanto para os alunos e alunas, como para a classe docente o que implica um debate claro em torno dos objetivos, daquilo que se planifica, assim como a discussão de um conjunto de alternativas. Mais, entende ainda o currículo integrado como uma forma dos cidadãos e cidadãs aprenderem a mover-se em estruturas flexíveis, numa sociedade onde a palavra flexibilidade foi convertida num vocábulo mágico. A questão que lhe colocamos é a seguinte: Como explica a existência de condições para uma discussão ampla e justa em torno dos objetivos educativos, em geral, e curriculares, em particular, sobretudo numa altura em que as políticas sociais neoliberais têm vindo a fragilizar, progressiva e acentuadamente, tanto o papel dos alunos e alunas quanto o da classe docente?
Jurjo Torres Santomé – Obviamente, não é de estranhar que com esse tipo de políticas sociais de fundo, o programa integrado esteja a retroceder. As políticas neoliberais e conservadoras que têm dominado a última década não estão interessadas em propostas pedagógicas baseadas na interdisciplinaridade, pois isso implica que os conteúdos curriculares não possam ser controlados com tanta facilidade. Caso se trabalhe com um programa integrado nas aulas surgem mais facilmente perguntas menos convenientes para as pessoas conservadoras. Pensar na diferença que existe na hora de se falar da reprodução humana como uma lição de biologia ou como ponto fundamental de um projeto de trabalho integrado. No primeiro caso, apenas seriam trabalhadas as noções de biologia, no segundo caso, o aluno teria de determinar, para além dos aspectos puramente fisiológicos, a temática da sexualidade ou seja o prazer das relações humanas, os tipos de sexualidade, as condutas sexuais e as respectivas valorizações sociais, o mercado da sexualidade, a igualdade de gêneros nos comportamentos e inter-relações sociais, a história da sexualidade, o papel das religiões na construção das funções da sexualidade e as diversas modalidades de matrimônio, etc. Ou seja, estaríamos a forrar uma cidadania mais informada e responsável, capaz de pensar de forma autônoma, não aceitando dogmas e imposições autoritárias.
Na Espanha, na nova Lei da Qualidade da Educação em vigor desde 2002, vê-se claramente como desapareceu a aposta na interdisciplinaridade; já não se fala de temas colaterais, a opção tímida que promoveu a lei socialista anterior, regressando-se à linguagem severa das disciplinas. Falar da realidade com um conhecimento disciplinar permite ocultar muito melhor aquelas perspectivas mais conflituosas dessa mesma realidade, permitindo dissimular os interesses políticos, militares, religiosos, econômicos, de gênero, etc., dessas divisões da realidade que apresentamos aos alunos como tema de estudo.
Se os conteúdos das diversas matérias escolares têm de possibilitar ao aluno avaliar outros modos de vida e valores diferentes pelos quais se regem familiares e amigos, tornase óbvio que a não promoção de maiores quotas de interdisciplinaridade e programas transversais é uma forma de dificultar enormemente a educação de uma nova cidadania.
As políticas contemporâneas dos países, como é o caso a Espanha, têm nos governos partidos conservadores que defendem modelos econômicos neoliberais. Outro rasgo distintivo subjacente é a notícia da participação em todas as esferas da sociedade e, portanto, no âmbito da educação. Assim, por exemplo, os conteúdos obrigatórios, o programa nacional, é legislado sem antes se promover qualquer debate social acerca da sua conformidade, oportunidade e validade. É o governo que de um dia para o outro, decide publicar um decreto com uma lista de conteúdos para o ensino obrigatório, mas sem explicar porque faz este tipo de seleção da cultura. Uma série de burocratas decidem o que é importante e o que acham que não é não incluem nessa lista de temas obrigatórios que o aluno deve estudar. Para além disso, com a nova Lei da Educação é diminuída a participação tanto das famílias como dos alunos e dos professores na vida das escolas. Reforça-se o papel dos diretores das escolas, dotando-os com mais poder de decisão.
Uma vez mais se constata, que quando se diz que nas nossas sociedades estão a perder liberdades, algo que muitos temos vindo a denunciar, não nos estamos a referir a abstrações, mas sim às possibilidades reais que os cidadãos têm de se fazerem ouvir e poder participar nas tomadas de decisões que nos afetam a todos. Contudo, isto não significa que não existam possibilidades de criar formas mais democráticas de gestão e participação nas escolas. As liberdades sempre foram uma conquista e não uma oferta daqueles que governavam. Temos de pensar que existem muitos professores, assim como estudantes e cidadãos que não aceitam este corte de liberdades. Obviamente isto obriga a que não nos esqueçamos das estratégias utilizadas noutros momentos da história para lutar pelos mesmos ideais. Convém estar alerta e ter na memória o passado, pois uma das estratégias às que recorre a direita é o corte das fontes de memória, fazendo-nos crer que só existe o presente e que este é e será sempre assim. Na memória do passado temos armas suficientes e formas de ação para fazer frente aos que tentam impor um único pensamento, aos que se adiantaram para consolidar o fim da história.
Há muitos docentes envolvidos em experiências educativas com muito valor e convém apoiá-los, divulgar os seus trabalhos para fazer ver às gerações de professores mais jovens que existem alternativas.
Desta forma, o aluno tem de aprender que nem todas as coisas que se estudam nas escolas têm de servir para ganhar dinheiro e cargos de poder. Infelizmente, o mercantilismo está a causar grandes estragos entre a juventude, mas não nos esqueçamos que outra das características das últimas décadas é o crescente número de organizações de voluntários, de Organizações não-Governamentais dedicadas a colaborar com os sectores sociais mais desfavorecidos: estas ONG’s são na sua grande maioria constituídas por jovens, por adolescentes que ainda acreditam no valor das utopias e empregam o seu tempo, os seus saberes e inclusivamente põem em perigo as suas vidas para ajudar os outros. Esta juventude encontra-se na sua maioria escolarizada, sendo assim mais fácil mobilizá-la se formos capazes de lhes demonstrar a importância da educação. Estes alunos são aqueles que irão exigir que nas aulas se discutam temas vitais, que se debatam as questões que muitas vezes ocupam as primeiras páginas dos jornais e telejornais. O programa integrado é a estratégia mais adequada para converter as aulas em espaços de vida.
Currículo Sem Fronteiras – Você tem uma determinada experiência ao nível da educação pré-escolar. Num outro espaço, você reflete sobre o brinquedo e o jogo como instrumentos de socialização, produção de consciência, transmissão de ideologias. Entendendo a educação como um projeto político [dado que constrói a identidade de um determinado país] e uma vez que os primeiros passos educativos e curriculares se dão ao nível do ensino pré-escolar, por que razão este nível de ensino tem sido tão negligenciado nas agendas políticas?
Jurjo Torres Santomé – Penso que este é um bom exemplo do desmoronar do Estado de Bem Estar que está a criar ideologias neoliberais. É tudo uma questão econômica e para tal é necessário diminuir as hipóteses de intervenção do Estado para compensar minimamente os excessos do mercado. A opção neoliberal do Partido Popular de José Marfa Aznar explica-nos a orientação mercantilista da nova lei de qualidade da educação (LOCE); o que justifica a defesa clara do ensino privado e, como conseqüência, o abandono que se tem vindo a sentir nos últimos anos em relação ao ensino público. A finalidade é converter o Sistema Educativo num mercado, regido apenas pela lei da procura e da oferta; mesmo sabendo que nem todas as pessoas possuem capacidades, informação e recursos econômicos para fazer a seleção de temas sobre educação. É também este governo neoliberal que reduz a oferta da educação infantil, em especial do grupo com idades entre os zero e os três anos. Recuperaram inclusive o nome injusto de Educação Pré-escolar para essa primeira etapa dos zero aos três anos.
Foram as lutas das professoras progressistas, dos sindicatos dos professores e das Associações cívicas dos bairros que conseguiram transformar a Educação Pré-escolar em Educação Infantil; algo que o governo socialista que chegou ao poder em 1982 contribuiu para a legitimação, resultando assim, na Lei da Educação de 1990, a LOGSE, passando o grupo dos zero aos seis anos de idade a ser conhecido por Educação Infantil.
Falar de Educação Pré-escolar é reconhecer que a educação das crianças entre os zero e os seis anos é algo pouco importante; mais relacionado com a guarda das crianças enquanto os pais trabalham. Tanto a designação Pré-escolar como as funções que se estabelecem, dando mais importância à componente assistencial do que à componente educativa, colocam esta etapa fora do sistema educativo e, inclusive, à margem do Ministério da Educação. Na Espanha durante os governos anteriores ao do Partido Socialista, esta etapa dependia de vários ministérios: Ministério da Educação e também do Ministério do Trabalho. Existiam redes de creches promovidas pelo Ministério de Trabalho para facilitar a incorporação de mulheres no mundo do trabalho, uma situação correta mas que não pode ser feita à custa de uma oferta de educação sem qualidade às crianças.
A Educação Infantil como etapa que abarca as idades dos zero aos seis anos, foi uma conquista social que teve início na década dos anos setenta. Todo o conhecimento especializado que se tem vindo a construir até hoje, sobre o desenvolvimento e a aprendizagem infantil têm uma grande importância nestes anos iniciais. É por esta razão que a designação anterior, LOGSE (1990), apoiando-se no que as Neurociências, a Psicologia, a Pedagogia e a Sociologia têm vindo a constatar, propõe como medida política de justiça social, garantir a educação das crianças desde o momento do seu nascimento. Algo que as famílias mais favorecidas já vinham a fazer através de inúmeros programas privados de estimulação precoce e de educação infantil. Qualquer governo minimamente comprometido com políticas de igualdade de oportunidades e de justiça social não pode deixar de dar atenção a esta etapa educativa. Este é um dos marcos que servem para avaliar as políticas educativas e sociais.
A maleabilidade que caracteriza o ser humano nos primeiros anos de vida é o argumento de maior peso na hora de defender a necessidade de uma Educação Infantil de qualidade. Atualmente, a ciência confirma como o desenvolvimento da fala, da cognição, a regulação das emoções, o desenvolvimento psico-motriz, precisam de um ambiente com os estímulos adequados para um bom desenvolvimento. E necessário um projeto educativo em que esteja bem planificada a regularidade de determinadas rotinas, a repetição de determinados exercícios, as variações graduais de determinadas tarefas, a duração e continuidade de determinadas estímulos.
É este tipo de ambiente educativo que vai possibilitar que as crianças, através das interações que estabelecem, das experiências em que participam, vão construindo as suas capacidades, adquirindo conhecimentos que irão mais tarde condicionar outros. A socialização como membro de um grupo cultural de uma comunidade humana requer ajuda, não é algo que venha com os genes.
Um pequeno diagnóstico sobre a Educação Infantil deveria ter em consideração o trabalho que os professores têm vindo a desempenhar nesta etapa. O seu trabalho, claramente educativo faz com que inclusive as tarefas que tradicionalmente assim eram consideradas, passassem a sê-lo graças ao seu esforço e profissionalismo. Refiro-me a tarefas tais como os cuidados e a limpeza corporal, o descanso, o sono e o período de lazer. As tarefas que a uns anos atrás se desenvolviam de uma forma rotineira, mecânica e fria mas que agora se converteram em momentos educativos.
Obviamente, esta etapa educativa também cumpre um trabalho essencial, dado que facilita às mães e aos pais o desempenho das suas carreiras profissionais. No entanto, foi o trabalho dos que têm a responsabilidade de educar durante esta etapa que contribuiu para uma volta nestas funções: as tarefas que há pouco tempo eram as mais idiossincráticas das instituições que acolhiam as crianças durante estas idades. Atualmente as necessidades infantis passaram a ocupar o centro das atenções.
Tenhamos presente, mesmo assim, que o trabalho das Escolas Infantis têm vindo a desenvolver, não começa e termina com o aluno, alcançando cada vez mais as famílias. Um bom exemplo é que cada vez há mais escolas “Escuelas de Madres y Padres” promovidas a partir destes centros escolares. É também desta forma que as famílias vão conhecendo melhor como são as suas crianças, como podem ajudá-los no seu desenvolvimento e, assim, compreender a importância de colaborar e participar nas escolas para melhorar a qualidade da educação. Esta tarefa de formação que se realiza junto das famílias surge e consolida-se mais como uma tarefa educativa, dado que os professores que trabalham nesta etapa possuem uma formação que nunca existiu anteriormente. As famílias foram assim aprendendo cada vez mais a dar valor à Educação Infantil e passaram desta forma a ser mais exigentes com as escolas para onde enviam os seus filhos.
Mas os resultados conseguidos nesta etapa não se ficam por aqui. Recorde-se que é na Educação Infantil onde surge uma das revoluções mais importantes do século XX nas metodologias didáticas. Os centros de interesse, os métodos globalizados, o trabalho com projetos e as unidades didáticas são estratégias para adaptar o que se pretende ensinar em função das características de cada criança, têm a sua origem na etapa Infantil, mas muito cedo este tipo de inovação vai-se adotando também noutras etapas, principalmente na Escola Primária, embora também na Escola Secundária, em especial quando os professores estão preocupados em estimular os seus alunos com matérias relevantes e significativas
Uma simples observação do Sistema Educativo tenderia irremediavelmente para valorizar este proveito e, assim, promover e reforçar cada vez mais esta etapa educativa, o que representa o inverso do que agora se pretende com a LOCE (2002), que implica retroceder muitas décadas, quase até ao século XIX, quando surgiram as creches. Nessa altura eram as necessidades dos processos de industrialização em curso as que levaram à criação de creches que cuidavam das crianças durante as horas em que os adultos estavam a trabalhar. As indústrias em crescimento necessitavam muito de mão de obra, como tal, se se pretendia que as mulheres trabalhassem fora de casa era imprescindível criar alguma instituição para cuidar das crianças.
Uma prova da regressão na concepção educativa para esta etapa dos zero aos três foram as declarações recentes do Ministro Espanhol do Trabalho, Eduardo Zaplana, quando anunciou como promessa para o próximo exercício a garantia da criação de 400 mil novas creches, situadas o mais perto possível dos centros de trabalho e, se possível, dentro das próprias empresas. Um planejamento semelhante, recorrendo à denominação de creches, mostra que a única coisa que se pretende é a existência de espaços para guardar, cuidar e vigiar. O mercantilismo dominante afasta as funções educativas e origina um forte ataque aos Direitos da Criança.
Qualquer Governo com um mínimo de preocupações pela infância teria que considerar um plano para expandir a educação nesta etapa e, inclusivamente, torná-la gratuita, especialmente se pretendesse que os grupos sociais mais desfavorecidos se preocupem pela educação dos seus filhos. Recordemos que sempre que se deu atenção a estes grupos uma das medidas a que tradicionalmente se recorria era a programas de Educação Compensatória dirigidos aos meninos destas idades.
A Educação Infantil deve continuar a ser uma etapa educativa, o que não obsta que ao mesmo tempo desempenhe, embora de forma secundária, outras funções sociais, como a de facilitar o trabalho das mulheres e dos homens fora de casa e ser também uma instituição que sirva para contribuir na reorganização dos bairros, povos e aldeias em que se habita. Cada vez são mais as escolas infantis que desenvolvem projetos educativos em que estão envolvidas não só as famílias, mas também outras instâncias sociais, como as associações vizinhas, as lojas e negócios comerciais à sua volta, instituições como a polícia local, os bombeiros, etc. Quando a escola trabalha desta forma, transforma-se numa instância de reorganização comunitária, visto que nos torna conscientes de quão interdependentes somos e que todos devemos ser. Ao mesmo tempo em que se contribui para facilitar a socialização das crianças, faz-se com que os adultos, se tomem conscientes dos laços que nos unem.
Apresentar esta etapa como etapa principalmente assistencial significa deixar a perder todo o trabalho realizado até agora pelas escolas infantis que estão comprometidas com uma filosofia e uma política claramente educativas.
Falar de educação Infantil é falar dos Direitos da Criança, falar de educação pré-escolar é falar apenas a partir do direito das mulheres ao trabalho. As mulheres têm que dispor de boas condições para exercer os seus direitos como cidadãs e trabalhadoras, não devendo por esse fato condicionar a qualidade da educação a que têm direito às crianças dos zero aos seis anos.
Destacar esta etapa como pré-escolar é algo muito bem visto pelo Governo neoliberal de José Maria Aznar, pois deste modo pode reduzir ainda mais o seu investimento no mundo da educação, para, entre outras coisas, poder investir mais em armas de destruição massiva, juntar-se às aventuras bélicas imperiais de George Bush.
Currículo Sem Fronteiras – No seu trabalho “O Currículo Oculto” você efetua uma excelente análise em torno do conceito gramsciano de hegemonia dissecando o modo como determinadas ideologias se conseguem impor porque garantem um determinado consenso através do consentimento das classes que se encontram arredadas do controle do poder. Boaventura Sousa Santos na sua obra “A crítica da razão indolente; contra o desperdício da experiência” contesta a noção de consensualidade inerente ao fenômeno hegemônico e avança com o conceito de resignação, o que de modo algum colide na sua análise com a noção de agência humana. Dado o momento atual, onde as políticas sociais conservadoras têm deixado um rasto de multiplicação da miséria e de segregação econômica e cultural gritante estaremos a viver um momento de resignação ou, pelo contrário, mantém que assistimos a uma estratégia de geração de consenso?
Jurjo Torres Santomé – Na minha perspectiva penso que ambas as coisas podem compatibilizar-se como explicação. As escolas, em conjunto com os meios de comunicação de massa estão a desempenhar um papel importante na construção do consenso. Ao censurar montanhas de informação e só apresentar e insistir com teimosia em determinados discursos explicativos e justificativos da realidade, conseguem que muitas pessoas acreditem nessa explicação e acomodem a ela os seus comportamentos e expectativas vitais. No meu livro “Educación en tiempos de rico liberalismo” (2001) dedico um capítulo inteiro ao que dou o nome de o processo de naturalização das condutas individuais recorrendo a explicações inatas. Os discursos hegemônicos neste momento histórico em que os meios de comunicação cada vez são menos independentes, dado que as grandes empresas têm consciência da sua importância e, por isso, se apropriaram deles, jogam um papel muito importante na construção do consenso especialmente na medida que empregam grandes esforços a “naturalizar” as situações de injustiça. Assim, quando se fala do fracasso do êxito escolar, de problemas disciplinares nas aulas, do que conhece ou desconhece o aluno, a unidade de análise costuma ser a pessoa individualmente considerada e o discurso utilizado também tratará de deixar clara exclusivamente as responsabilidades pessoais. O êxito e as possibilidades de promoção são vistas como atos de competitividade entre pessoas que mediante o esforço individual e as suas capacidades naturais inatas, conseguem méritos com os quais podem competir e concorrer ao acesso a privilégios sociais de forma igualmente individual.
Em geral, podemos dizer que recuperam valor as posições teóricas e políticas que defendem a primazia das eleições pessoais e da mobilidade social individual, não considerando as condições estruturais que levam ao fracasso social e logicamente, escolar, aos grupos sociais mais afastados do poder.
Desde as instâncias oficiais, não se promoveram análises que tenham em consideração mais perspectivas e interesses sociais comunitários. A sociedade vê-se como reificada, com uma roupagem de despolitização e neutralidade, não dá atenção aos problemas de desigualdade política, econômica e social de caráter estrutural.
Logicamente, o atual marco econômico, político, cultural e social dominado pelas políticas de mercado e de fragmentação social precisa de discursos que confluam na construção da conformação do consenso da cidadania sobre a inevitabilidade das concepções dominantes.
As teorias acerca do individualismo serão um dos pretextos mais recorrentes para manter e justificar o atual estado das coisas, o mundo em que vivemos.
Se as pessoas se sentem sós e pensam ser as únicas responsáveis pelo seu destino, sem que as estruturas sociais, a distribuição dos recursos e o poder condicionem as suas escolhas, a sua vida como indivíduos, torna-se muito fácil cair na resignação. A resignação, no meu ponto de vista, é a ausência de alternativas, inclusivamente incapacidade sobre a possibilidade de as imaginar. Imaginem, por exemplo, o papel que desempenham as teorias do fim da história desenvolvidas por Francis Fukuyama. Estamos diante de discursos com os quais se pretende construir um tipo de pessoas que aceitem como inevitável as suas realidades: pessoas que normalmente são limitadas nas suas aspirações pessoais, ao assumir que o melhor é “deixar-me estar como estou”, pois como diriam algumas das leis de Murphy que circulam entre as pessoas, “tudo o que pode piorar acabará por acontecer”.
Com linhas de discurso semelhantes às de Fukuyama, pretende-se que as pessoas não cheguem a pensar nas enormes disfunções que as atuais formas de economia capitalista neoliberal estão a provocar, nem se procurem imaginar outras alternativas. Não será de estranhar que desde os círculos do poder e meios de comunicação com que são bombardeados os cidadãos, se consiga desvirtuar também os discursos sobre o significado e formas de democracia e se discuta sobre os Direitos Humanos como algo abstrato, sem qualquer ligação à vida quotidiana de cada ser humano ou de cada povo. É desta forma que quem ocupa postos de responsabilidade na defesa do poder estabelecido trava a conflito das crises nos mercados, procura convencer a população de que o desemprego originado pelo capitalismo atual, as injustiças e a pobreza deste momento histórico são coisas normais, no entanto, passageiras que se atravessam num caminho futuro de grande prosperidade.
É curioso como, entre as teorias preferidas pelas opções mais conservadoras e fundamentalistas, que de uma maneira insistente aparecem e reaparecem ao longo do século XX, deve-se distinguir as que vão ligar os comportamentos a condicionamentos biológicos das pessoas, a sua estrutura genética, à conformidade dos seus cérebros ou a níveis hormonais. Caso se consiga convencer cada pessoa que o seu destino social está programado no seu código genético, a partir desse momento não terá outra saída senão “suportar” o mundo, não se lembrará de lutar para que se transforme, pois como se pode lutar contra o que está decidido no código genético. Um pensamento idêntico leva-nos a pensar em imagens de épocas anteriores quando o ser humano era uma marionete das divindades que lhe negavam a liberdade para poder decidir e participar na construção do mundo. Penso que é urgente lutar contra este pessimismo e que são muitas as pessoas que ambicionam fazê-lo. Estou convencido que se nos dedicarmos a salientar as possibilidades a que temos acesso na atualidade para melhorar o estado das coisas, a pôr diante dos olhos dos nossos alunos exemplos positivos de como muitos grupos sociais lutaram com êxito pelos seus direitos, como conseguiram melhorar as suas condições de vida coletiva, estaremos a educar pessoas com confiança no futuro e não pessoas resignadas.
A cultura da comunidade foi promovida por pessoas que se sentiam mais perto das restantes, mas que estavam, sobretudo, convencidas de que era possível alterar o rumo da história: existiam projetos de sociedade que eram vistos como viáveis se atuassem em coordenação com os restantes vizinhos. Nestes momentos, o pensamento neoliberal esforça-se por abrir caminho a esses ideais de transformação, tentando convencer as pessoas de que já não é possível idealizar outro tipo de sociedade. A esquerda política desanimou-se devido aos fracassos dos modelos comunistas e, na atualidade, a direita é mais conservadora, especialmente na mão dos movimentos religiosos mais fundamentalistas, que estão a tentar realizar projetos comunitários em grupos que não teriam outra saída senão a resignação. De qualquer forma, é tal o nível de frustração que as formas de organização do trabalho capitalista originam em cada vez mais camadas da população que voltam a observar-se sérias intenções de resposta da esquerda. Movimentos sociais populares como o “Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra” (MST) no Brasil, dos grupos anti-globalização, ecologistas, feministas, etc., é importante dar-lhes cada vez mais visibilidade para provar que nem tudo está perdido. Quiçá, já possamos começar a afirmar que começa a dar-se uma transformação no significado de comunidade, não a sua eliminação: surgem novos tipos de associação diferentes das mais tradicionais: partidos políticos e sindicatos. No entanto, pode ser que estes novos tipos de associação cheguem a ser política e socialmente mais eficazes, que facilitem uma melhor coesão social que as anteriores, cujas estruturas, fortemente burocratizadas e profissionalizadas, não ajudam os cidadãos a vê-las como parte de um projeto que diga respeito a todos os membros da sociedade.
Currículo Sem Fronteiras – No seu livro “Globalização e interdisciplinaridade”, você, entre outras questões, salienta a necessidade de um currículo globalizado, com integração das áreas do conhecimento, não fragmentado em disciplinas estanques, compatível com a realidade. Na verdade, isto, em essência, não é uma posição muito diferente da que foi colocada em prática por Dewey, na sua Escola Laboratório em Chicago. Gostaríamos aqui de colocar duas questões. Em primeiro lugar, como transformar a globalização por via da educação, em geral, e do currículo, em particular, num fenômeno de plena justiça e equidade social. Em segundo lugar, por que razão, muitos educadores e demais curriculistas [mesmo situados na esquerda política] persistem em negligenciar nas suas análises o pensamento de Dewey? Será por ter sido um personagem controverso politicamente?
Jurjo Torres Santomé – Quando utilizo o termo globalização neste livro faço-o num sentido diferente daquele que a palavra tem na atualidade. Na Espanha o termo globalização, aparece, curiosamente, pela primeira vez no mundo da educação, como uma metodologia didática coerente com o modo em que a psicologia evolutiva nos indicava que se fomenta o desenvolvimento e a aprendizagem humana. Foi uma metodologia muito divulgada na década de setenta, apoiando-se num primeiro momento nas investigações da psicologia da Gestalt e, posteriormente, na criação da psicologia genética da escola de Piaget. É uma perspectiva em que o centro do discurso justificativo se situa na pessoa, individualmente considerada. A questão fundamental é: como é que as pessoas compreendem a realidade e como aprendem? A psicologia de Piaget e, em concreto, as investigações de Ausubel sobre a aprendizagem significativa, junto com os trabalhos de Ovide Decroly e a sua metodologia dos centros de interesse, são os motores de arranque, desenvolvimento e inovação curricular que denominávamos como “globalização”. Nesse livro, argumento que o programa integrado se justifica de um modo muito contundente recorrendo a três grandes linhas de argumentação: 1) o discurso da globalização (ou a melhor forma de promover a aprendizagem individual), 2) o da interdisciplinaridade e 3) da mundialização. Estes dois últimos discursos centram a nossa atenção, por um lado, nas perversidades que se produzem quando se intervém na realidade de um modo disciplinar, como comentei anteriormente, e, por outro lado, a necessidade de alargar os nossos horizontes a realidades mais distantes quando se contemplam os resultados das nossa ações. Esta última linha discursiva é a que hoje em dia se tem vindo a denominar de “globalização” ou em terminologia mais francófona, “mundialização”. Em concreto, no livro sobre o Programa Integrado, servi-me da palavra mundialização, pois no meu país naqueles anos no âmbito da educação o conceito globalização era usado como metodologia para trabalhar nas aulas. De fato, a LOGSE, a lei da educação que acaba de ser abolida, especificava claramente que as metodologias com que devia trabalhar nas aulas de Educação Infantil deviam ser “globalizadas”. Imagina que tem sido muito falado um livro que escrevi no início dos anos noventa, mas, no entanto, há mais de década que se publicavam trabalhos sobre essa metodologia didática mais integrada.
Cada vez estou mais convicto da urgência de avançar para teorias mais integradas se realmente queremos educar e facilitar o acesso reflexivo à informação dos alunos. Um compromisso com a justiça no âmbito educativo obriga a termos presente a possibilidade de se incorrer continuamente numa enorme injustiça curricular, dado que é muito provável que tanto os conteúdos dos programas escolares como as tarefas de cultivar o aluno para que aprenda estejam mais relacionados aos interesses dos grupos sociais mais favorecidos. Quando alguns grupos sociais observam que as suas propostas são mais consideradas nas aulas que outras, isso significa que com os mais desatentos estamos a criar situações de injustiça curricular. Estas situações injustas são mais agravadas dado que as crianças pertencentes a grupos sociais mais desfavorecidos costumam aprender em escolas mal dotadas, sem bibliotecas, sem laboratórios, com poucos professores; escolas que também têm falta de profissionais para ajudar: orientadores educacionais, assistentes sociais, bibliotecários, professores de apoio, etc. Uma escola mal dotada é um sinal claro de injustiça curricular e social.
Mas, voltando a centrar-me apenas na tua pergunta, existe um fenômeno que penso deve merecer uma atenção muito especial, o da mundialização ou globalização sociopolítica. Obviamente, a globalização neoliberal que se promove em todo o mundo é algo verdadeiramente perverso, porque só favorece as grandes empresas multinacionais a fazer negócios ainda mais rentáveis, sob a ameaça aos Estados de encerrar empresas para as ir abrir noutros países que ofereçam condições mais vantajosas, ou seja, a Estados com sindicatos muito fracos, inclusive a países sem democracia e sindicatos, como tal, com trabalhadores sem qualquer proteção e forçados a trabalhar em situações de semiescravidão ou escravidão total. É necessário fazer frente a este tipo de globalização recorrendo a movimentos sociais, à globalização dos direitos de cidadania. Penso que as instituições escolares desempenham um papel fundamental na tentativa de se conseguir estes direitos humanos em nível mundial. A escola deve ser um espaço onde aprendemos a ver-nos como seres humanos interdependentes, como pessoas que cada vez que tomamos alguma decisão saibamos que teremos de ter em consideração quais as repercussões em temas que estão mais afastados de nós. A criação de uma mentalidade solidária em nível mundial tem de ser um objetivo de trabalho de todos os professores. Uma mentalidade semelhante obrigaria a cada cidadão pensar de uma forma mais internacional, ou seja, por exemplo, quando compramos uma camisa numa loja não só olhamos para o preço dessa peça de roupa, se é barata, mas também prestamos atenção a: onde é fabricada?, em que condições estão as pessoas que a fabricaram?, existem crianças a trabalhar nessas empresas?, os salários desses trabalhadores são justos?, as matérias primas foram obtidas e pagas de uma forma justa?, etc. Uma “escola globalizada” é também aquela em que o aluno mantém uma comunicação fluida com outras instituições escolares mais afastadas, em que se informa dos problemas dessas crianças e, inclusive, tenta arranjar formas para tentar ajudar a resolver esses problemas.
Se para a manutenção de qualquer democracia é necessário existir uma cidadania educada e informada, a luta por um mundo global mais democrático e justo precisa dessa cidadania, mas com uma consciência claramente planetária, acostumada a ter uma visão solidária e responsável para lá dos limites do seu bairro, cidade ou país. A nossa escola tem uma grande tarefa a planear, a colaboração na mundialização da visão, mas mais urgente é a preocupação com a pobreza, as necessidades e as injustiças. A preocupação com as realidades internacionais mais inúteis e classicistas, é algo que infelizmente muitos grupos têm vindo a promover, em especial, os meios de comunicação em massa. Não devemos permitir que a globalização apenas ocorra com os anúncios da Coca-Cola, com os restaurantes da MacDonald’s ou da Pizza Hut, devemos trabalhar no sentido de tornar visível as grandes urgências de muitos países, as enormes injustiças suportadas por inúmeros povos e, conseqüentemente, mobilizar a cidadania para a criação de estratégias para solucionar estes problemas. O ensino da matemática, da história, da literatura, das ciências, da língua, … A matemática tem de servir para que as novas gerações aprendam a medir e quantificar as injustiças suportadas por muitos milhões de crianças; as aulas de história devem contribuir para explicar como se geraram noutros momentos de história conflitos que atualmente ainda continuam por se resolver; a literatura tem de servir para que as crianças possam entrar em contato com outras idéias mais afastadas, com realidades, sonhos e aspirações que são narradas por pessoas que vivem fisicamente mais afastadas de nós e, além disso, para que se expressem através de uma linguagem muito rica e elaborada e noutros idiomas não hegemônicos, mas que são utilizados por muitas pessoas.
Ao que me é dado a entender sobre o esquecimento de John Dewey, penso que se deve fundamentalmente ao fato de vivermos numa sociedade majoritariamente consumista que considera “fora de moda” e que já não vale a pena tudo o que não se produziu ou escreveu nestes últimos dois meses. Estou convencido de que uma imensa maioria de pessoas que trabalho na área da educação nunca sequer leram um livro escrito por Dewey. Parece-me uma grande injustiça, pois acredito que é dos poucos autores do século XX que deveriam ser considerados de leitura obrigatória. Preocupa-me o esquecimento enorme de obras que continuam a ter uma importância fundamental e que poderiam servir para abrir novos horizontes neste mundo que alguns consideram não ter futuro. Surpreende-me de forma dolorosa ver que a maioria dos estudantes que fazem doutoramento ou inclusive professores no ativo que desconhecem a obra de autores como Celestin Freinet, Giner de los Rios, Mario Lodi, Condorcet, Emile Durkheim e a pedagogia institucional francesa, etc. Não acredito que na maioria dos casos seja devido a censuras explícitas por parte dos professores que estão a formar as novas gerações de professores, mas sim ao fato de nesta sociedade consumista termos a tendência a ver apenas o último livro que acabou de ser publicado e a considerar como defasado tudo o que foi publicado no ano anterior. Isto é um enorme erro ao qual temos de fazer frente.
Currículo Sem Fronteiras – No seu mais recente trabalho “Educação em tempos de neoliberalismo”, você desafia o pensamento único, defende a recuperação da utopia como um dos motores da transformação social, opõe-se à lógica de que não existem alternativas à “cruzada” neo-liberal e denuncia [tal como Gimeno] o mercado como uma metáfora inadequada para a educação. Se houve oratória e prática política que mais tumultos criou no tecido educativo foi, sem sombra de dúvida, o neoliberalismo. Trazendo mais uma vez Dewey à colação, quais os grandes desafios que enfrentam agora os educadores perante o cerco cada vez mais apertado das políticas neoliberais?
Jurjo Torres Santomé – Penso que o maior perigo tem a ver com a destruição do Estado de Bem-estar e em concreto do Ensino Público. A educação para os governos conservadores e grupos neoliberais já não é considerada como um serviço público, mas sim como ume rede de centros que são colocados à disposição das famílias de forma a escolher para onde vão estudar as crianças. Por sua vez, as famílias observam atentamente os colégios como um local onde os seus filhos aprendem algo que servirá amanhã para terem um salário e prestígio social. A filosofia de mercado está a apoderar-se do pensamento, das práticas e das instituições escolares. Os compromissos principais que vinham orientando o pensamento e as diretrizes dos que trabalharam para e nas escolas públicas, estão a ser esquecidos no que diz respeito aos processos de privatização que afetam a educação. Vejamos, a título de exemplo, no difícil momento que nos encontramos em centros escolares organizados com base em argumentos que, até recentemente, serviam para organizar o trabalho educativo, tal como: a igualdade de oportunidades, a educação centrada no aluno, a integração das pessoas menos capacitadas, o anti-racismo, o anti-sexismo, o anticlassicismo, a democratização dos centros, a escola ao serviço da comunidade, o multiculturalismo, a educação crítica, a educação compreensiva… Discursos e opiniões sobre a educação que atualmente estão sendo atacados frontalmente por parte dos defensores do mercado e das ideologias conservadoras, se bem que é de ressalvar que ainda existe um grande número de professores que continuam a ter estes objetivos ou semelhantes como motor das suas vidas.
Ao admitir-se a comparação dos colégios com as empresas teremos de admitir também que a procura de benefícios econômicos privados é um dos seus principais objetivos. No entanto, convém não esquecer que, enquanto os negócios privados tentam conseguir lucros para os seus proprietários e acionistas, as instituições públicas regem-se pela procura e ganhos de bens públicos, de prestações destinadas a toda a população, dando maior atenção aos que mais dela precisam.
É conveniente comprovar se a possibilidade de se obterem benefícios econômicos por parte da iniciativa privada podem levar a perdas sociais; em determinadas circunstancias é provável que a obtenção de lucros se dê à custa de interesses sociais. Um exemplo destas perdas sociais é o caso das empresas poluentes que para obterem maiores benefícios econômicos não têm quaisquer problemas em gerar maior poluição atmosférica ou marítima, de destruir determinadas áreas naturais ou explorar determinados minerais e plantas. No caso em questão, as perdas sociais são resultado da potenciação de uma rede de centros privados que continuam a favorecer a desorganização social; conseguindo que determinados grupos sociais menos favorecidos acabem por ficar limitados a escolas públicas tipo “apartheid”.
Não nos passará despercebido que defende uma economia de mercado neoliberal não se questiona sobre se são necessários alguns limites. Que não torne mais clara a diferença entre bens públicos e privados. Os bens privados, como o próprio nome indica são aqueles que são adquiridos e desfrutados pelas pessoas individualmente e que não afetam as restantes pessoas; o que acontece, por exemplo, com a aquisição de uma mesa ou de uma guitarra. Por oposição, os bens públicos são aqueles a que todas as pessoas têm acesso e que podem ser desfrutados por todos. Assim, a saúde é algo a que todos devem ter acesso, ao mesmo nível da educação, ou viver num meio ambiente sem poluição, visto que a saúde, a cultura ou uma boa qualidade do ar que respiramos, a água, as plantas e os minerais, contribuem de forma decisiva à conservação da vida no planeta. Limitando-nos mais à área da educação, considerada como um bem público significa um compromisso para com o desenvolvimento de todos os seres humanos, não sendo exclusivamente para aqueles que só porque nasceram no seio de determinada família têm recursos para ela. Tenhamos presente, para, além disso, que se todas as pessoas tiverem acesso a uma educação, a vida de toda a população será muito melhor, pois todos serão beneficiados com a contribuição dos outros. A violência, no sentido mais alargado da palavra, a mortalidade, as altas taxas de reprodução, as doenças e pragas que geram pobreza, a ignorância e a marginalidade serão obviamente reduzidas, o que será benéfico para toda a sociedade.
No Estado Espanhol, a política educativa neoliberal que vem sendo desenvolvida pelo Partido Popular (PP) tem como um dos principais objetivos, a liberdade de seleção de centros, mas com o sentido de aumentar a privatização do ensino. Um bom exemplo é o livro “La libertad de elección en educación” (1995), publicado por Francisco López Rupérez, Director Geral dos “Centros Educativos del Ministerio de Educación y Cultura” do Governo do Partido Popular (PP); obra editada pela Fundación para el Análisis y los Estudios Sociales, de que é presidente José Maria Aznar López, o Primeiro Ministro do Governo Espanhol. Nesta publicação, o autor, também ele ideólogo do PP, utiliza os seus esforços na tentativa de convencer as pessoas das vantagens da livre escolha, fazendo com que desapareçam os “clientes cativos” dos centros públicos. Este ideólogo conservador e neoliberal considera que as instituições públicas bem corno os funcionários que nelas trabalham são seres perversos, os quais têm de ser afastados das crianças, dado que segundo ele, estamos perante “um monopólio bilateral formado, por um lado, pelo governo e por outro pelos professores sindicalizados”.
Torna-se chamativa a forma como este autor se esquece de considerar a diferença radical que deve existir no comportamento do governo num regime ditatorial e num regime democrático. No primeiro caso é típica a tirania das decisões e ações, no entanto, numa democracia um comportamento como o que denuncia este Diretor Geral tornar-se-ia inconcebível, seria o maior sintoma da falsidade de uma situação que se denomina democrática. Uma frase como a anteriormente citada deixa transparecer a sua escassíssima fé nos mecanismos democráticos, a par da sua total antipatia com os Sindicatos, uma das instituições fundamentais das sociedades democráticas.
Quando o Estado se retira ou não intervém, equivale a deixar desprotegidos os grupos mais fracos. Estas crianças são as que estudam nos colégios piores, e com professores abandonados à sua sorte, sem ajuda para resolver os problemas que surjam. Eu estou habituado a dizer e é algo que desenvolvo neste livro a que fazem referência, “Educación en tiempos de Neoliberalismo”, que as escolas não podem ser clubes. As primeiras dizem respeito aos interesses de toda a cidadania, ao bem público, os clubes, pelo contrário, só se preocupam com os seus sócios. Penso que este é o grande desafio dos próximos anos: impedir que as escolas se transformem em clubes privados.
A privatização começa pela privatização das instalações, mas continua com a privatização dos conteúdos que se trabalham nas aulas. Se só preocupam os interesses privados dos alunos de cada clube, é previsível pensar que também se acabe por oferecer somente aquelas assinaturas [disciplinas] que interessem a esse grupo de famílias “proprietárias” do clube e, por hipótese, somente às perspectivas ideológicas que elas defendem. É a forma de construir sociedades dualizadas, fragmentadas, em que cada coletivo social vê os outros como rivais ou perigosos para iludir e eliminar.
A educação do futuro, tal como chamou a atenção a comissão presidida por Jacques Delors, tem entre os seus desafios trabalhar para que nas aulas as novas gerações aprendam a viver em comunidade. O neoliberalismo caminha na direção oposta.
Currículo sem Fronteiras – Você não esconde, de forma alguma, a sua identidade galega. Tem inclusivamente vinculado a sua posição política, de uma forma muito explícita, à causa galega, como demonstra o Manifesto 15D, emitido em Santiago de Compostela a 15 de Dezembro de 2001. Pode-nos explicar qual o grande propósito político do Movimento Reintegracionista Galego?
Jurjo Torres Santomé – Considero-me um nacionalista galego de esquerda. Algo que nos tempos de conservadorismo que correm pode ser considerado chocante, pelo menos para as pessoas que não vivem no que nós denominamos “uma nação sem Estado”. A Galícia é uma província dentro do Estado Espanhol que fruto das lutas sociais que têm sido levadas a cabo desde os finais do século XIX foi atingindo níveis importantes de autonomia, mas presentemente são insuficientes e daí que neste momento em províncias como o País Basco, Catalunha e Galícia se estão a exigir uma maior dimensão nos Estatutos de Autonomia que nos governam.
A finalidade do Manifesto do 15 de Dezembro de 2001, divulgado em Santiago de Compostela, era de protestar pela política lingüística que tem vindo a ser promovida pelo Governo galego, do Partido Popular, do mesmo partido que Governa o Estado Espanhol. Na Galícia a língua que falamos é o galego, também o espanhol, mas a língua própria, é o galego. Esta língua é uma variante do português, mas a política oficial, num primeiro momento tratou de a proibir. De fato durante a minha infância na escola castigavam-nos se falávamos em galego. Era a língua da incultura, diziam, e proibiam-nos de falar e, claro, estudar. Com a chegada da democracia e, em concreto, com a aprovação da Constituição Espanhola de 1978, reconheceu-se a Galícia como uma Nacionalidade histórica e o “direito” a falar-se em galego, mas não a “obrigação” de falar em galego. A política conservadora desde esse momento já não se opôs “oficialmente” à língua, mudou somente de estratégia: tentar dialetizar a língua galega, até se transformar numa variante do espanhol. Por ter sido tanto tempo proibida, a língua galega conservou-se fundamentalmente graças aos grupos mais populares, os que nunca tinham estudado ou tinham estudado pouco tempo. A língua ao ser estudada foi-se misturando com vocabulário e até com determinadas estruturas gramaticais próprias do espanhol. A estratégia de dialetização passava por legitimar essas influências e inclusivamente promover outras novas, até a língua galega ficar descaracterizada, confundindo-se com o espanhol. O movimento nacionalista apostou no reintegracionismo e a nossa estratégia e o nosso trabalho é recuperar a língua e devolvê-la ao início, o galego-português. É algo óbvio para qualquer Português, Brasileiro ou Galego, que vê como se entendem e utilizam o mesmo vocabulário.
Ser nacionalista de esquerda não é sinônimo de um reacionário e muito menos uma pessoa que quer abrir novas frentes para separar e expulsar aos não galegos.
Esta é a imagem que a direita e alguma esquerda estatal estão a divulgar para confundir a população e refrear o avanço do nacionalismo progressista. Nunca o nacionalismo galego falou de expulsão, mas sim de integração. Principalmente quando somos um dos povos do mundo que sofreu com mais crueldade o fenômeno da emigração. Nunca desde o nacionalismo se falou de refrear a chegada de imigrantes, algo que tanto o Partido Popular como o Partido Socialista Trabalhista Espanhol falam e legislam. Na realidade essa política de exclusão nacionalista é a que eles praticam, só que o que fazem é traçar outras fronteiras. Todos os dias as fronteiras espanholas expulsam centenas de cidadãos por não terem nascido na Espanha. Os nacionalistas galegos estão contra as leis de estrangeiros aprovadas no Parlamento Espanhol e contra elas votaram os Deputados do Bloco Nacionalista Galego.
O movimento nacionalista de esquerda pretende que a Galícia amplie o seu Estatuto de Autonomia para poder desenvolver as suas potencialidades econômicas, culturais e sociais, mas tendo ciente que a internacionalização e o universalismo são as chaves que devem impregnar e construir todas as nossas ações. Aquilo que nós sempre afirmamos é que o galego é todo o indivíduo que vive na Galícia e o que pretendemos é aproximar muito mais a cidadania às possibilidades de participar ativamente no projeto do que deve ser esta nação. De fato, uma das idéias que guiam os grupos nacionalistas é caminhar para uma Europa dos Povos, não dos Estados, pois acreditamos que desta forma cada uma das Nações que a compõem terão mais possibilidades de participar e agrupar. É a forma que considero para harmonizar uma Europa verdadeiramente democrática, sem “colônias interiores”, sem povos inteiros marginalizados.
Notas
1 Chumbar é uma expressão utilizada em Portugal para significar reprovação na escola. O mesmo que “tomar bomba” ou “rodar” no Brasil. [Nota dos editores]

.David Hockney – «Autumn Leaves«
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Evaluaciones cual bombas informacionales
Jurjo Torres Santomé
Cuadernos de Pedagogía
Nº 455, Sección Historias mínimas, Abril 2015, pág. 8
La burocracia de las nuevas bases de datos con los resultados de tests con los que organismos economicistas como la OCDE (PISA) o la IEA (PIRLS, TIMSS) evalúan a los centros escolares y cuyos resultados se hacen públicos de un modo muy impactante -en una rueda de prensa de ámbito mundial para atraer la atención de todos los medios de comunicación de los países implicados-, al igual que presumiblemente harán las autoridades del MECD con la política de reválidas que incluye la LOMCE, funciona cual bomba informacional, según la terminología de Paul Virilio.
Los resultados, vehiculados por los media, normalmente, de una manera acrítica y sin mayores contrastes, sirven para lanzar toda clase de reproches y contribuyen a generar y administrar una cultura del fracaso y del miedo entre el profesorado, en especial de centros públicos, y por supuesto entre las familias y la ciudadanía en general. Esta estrategia pretende, asimismo, imponer concepciones tecnocráticas de lo que es educar, pero sin hacerlas explícitas, y lo que es más importante, haciendo creer a la población que ese es el único y válido modelo educativo.
Estamos ante una estrategia de evaluación muy reducionista, basada en la aplicación al alumnado de una prueba de lápiz y papel, en un único día y centrada en un número muy reducido de asignaturas. Se echa por tierra el trabajo que en las últimas décadas se viene reivindicando de apostar por evaluaciones contínuas con metodologías cualitativas, estudios de caso e investigación-acción, dedicadas a averiguar de manera más relevante y en profundad donde están los puntos fuertes y débiles de cada estudiante, del trabajo docente y de las instituciones escolares, con el fin de remediar los déficits y mejorar.
La finalidad de una verdadera evaluación es generar motivación y aprendizajes. Como decía Jean Piaget, los errores son educativos en la medida en que nos ayudan a escrutar lo que venimos haciendo y a ensayar otras alternativas, corregiendo el rumbo de la situación y, por tanto, aprender todos, estudiantes y docentes.
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Margaret Keane – «Tomorrow forever«, 1963
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«Las autoridades quieren «tontos racionales»»
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Entrevista a Jurjo Torres
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Belén de la Rosa Rodríguez Secretaría de Formación FE CCOO
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TE CCOO enseñanza
Revista Trabajadores/as de la Enseñanza
Nº 350. Marzo-Abril 2015, págs. 22 – 25
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¿Existe otra manera de hacer educación?
Por supuesto. Teniendo siempre presente qué finalidades debe tener el sistema educativo y cada una de las etapas. Además, las TIC nos abren un sinfín de posibilidades inimaginables tres o cuatro décadas atrás. El espacio aula, los horarios específicos para cada asignatura, un largo listado de contenidos para cada materia y curso, los libros de texto, la interacción de un grupo de clase con un único profesor o profesora, el mobiliario de las aulas, etc. son ya modelos definitivamente inadecuados. Educar es todo un complejo de acciones e interacciones que llevamos a cabo en entornos apropiados con el fin de dotar de confianza al alumnado en sus capacidades y posibilidades como ciudadanos democráticos, críticos y optimistas. Desde la Convención de Derechos de la Infancia de 1989, niñas y niños desde el nacimiento ya son ciudadanas y ciudadanos, por tanto, como tales tenemos que tratarles y ayudarles.
Una concepción semejante nos sitúa en el polo opuesto al de la Iglesia más clásica, que decía que hasta los 7 u 8 años la infancia no tenía «uso de razón». La asunción de esta dimensión de ciudadanía nos obliga a los adultos a aprender también a relacionarnos con las niñas y niños como seres que tienen derechos y libertades; con lo cual el trabajo colaborativo, los proyectos de investigación, la consulta de numerosas fuentes, el debate, etc. tienen que ser el clima cotidiano de cualquier espacio escolar.
¿Qué entiende por pedagogías libres, pedagogías radicales, pedagogías disruptivas?
Son etiquetas muy borrosas, en especial en estos tiempos en los que la derecha aprendió a robarnos el verdadero sentido de las palabras más empoderadoras, a resignificarlas de manera contraria, coherente con ideologías conservadoras. Para mí, una educación libre y liberadora es aquella en la que estudiantes y docentes trabajan juntos, dispuestos a aprender unos de otros, planificando e investigando en equipo sobre temas relevantes. Con un profesorado optimista y que confía y anima en todo momento al alumnado. Docentes que están continuamente aprendiendo y actualizándose, y por tanto que se arriesgan a innovar. Centros escolares donde reina un clima de ayuda, pues tanto profesorado como estudiantes son conscientes de que no lo saben todo. Como ya nos enseñó Paulo Freire, todos en algunos momentos somos estudiantes y en otros docentes; aprendemos unos de otros.
¿Es posible educar de otra forma en un contexto de crisis?
Por supuesto, el problema es que las autoridades políticas cada vez temen más el ejercicio de la autonomía y, de manera especial, la libertad de cátedra. Entendiendo por cátedra el espacio escolar en el que estudiantes y profesorado ejercen y desarrollan sus derechos a la libertad de pensamiento. La pretensión del Ministerio de Educación de cercenar las dimensiones cívicas cayendo en una especie de infantilización o anulación de la profesionalidad docente es lo que explica, por ejemplo, los Reales Decretos de los currículos básicos, especificando de manera exhaustiva: objetivos, contenidos, competencias, criterios de evaluación, estándares de rendimiento y resultados de aprendizajes evaluables. Únicamente les faltó nombrar las editoriales de los libros de texto. Estamos ante políticas educativas autoritarias y de sospecha acerca de las capacidades, posibilidades y formación del profesorado.
¿Se puede educar en la asepsia, hay una educación neutra de verdad?
La asepsia solo existe en situaciones artificiales de laboratorio, en quirófanos… La vida real es la pluralidad derivada de derechos constitucionales como la libertad de pensamiento, de conciencia, ideológica. Lo contrario a la libertad de cátedra es el adoctrinamiento. Educar en libertad exige practicarla todos los días y a todas horas. La institución escolar, que trabaja con saberes construidos por seres humanos, tiene que hacer muy consciente de su provisionalidad al alumnado; por tanto, este debe verse obligado a entrar en contacto con recursos informativos que vehiculen las distintas perspectivas, valores, interpretaciones del conocimiento que circulan en la sociedad. Y, asimismo, trabajar esas fuentes con metodologías didácticas que les obliguen a contrastar, experimentar, debatir, buscar otros recursos, solicitar colaboración… En resumen, a aprender a aprender. Es así como el alumnado caerá en la cuenta de una verdad básica: que gran parte de nuestro conocimiento es provisional y que debemos estar muy alerta y con una mentalidad abierta y crítica ante la posibilidad de estar en el error. Educar es también ayudarles a interrogarse y a ver la historicidad, intereses y condicionamientos de quienes construyen, seleccionan y divulgan el conocimiento que se considera más valioso; ayudarles a detectar sesgos y prejuicios que afectan a colectivos sociales más desfavorecidos y promueven su inferiorización.
¿Es más de Foucault o de Bourdieu?
No me gustan este tipo de disyuntivas, en especial porque son autores que tienen sus puntos fuertes y débiles y, además, no sabríamos cómo analizarían el mundo del presente. Una sociedad neoliberal, pero también promotora de agresivas políticas neocoloniales, precisa de modelos que nos permitan sacar a la luz las desigualdades de clase, género, etnia, sexualidad, capacidades… Por tanto, me interesan además de clásicos como Antonio Gramsci o Manuel Sacristán, los análisis de Erik Olin Wright, Thomas Piketty, Nancy Fraser, Axel Honneth, Iris Marion Young, Saskia Sassen, Paco Fernández Buey…
¿Qué papel juega la educación en cuestiones como la violencia, la discriminación o la sexualidad?
Los centros escolares tienen que poner también su grano de arena para hacer frente a esos graves problemas. Como docentes debe preocuparnos, incluso obsesionarnos, que la vida y las experiencias educativas en los centros tengan siempre como listón para evaluar su validez la capacidad para contribuir a la equidad y a la sensibilización ante las numerosas formas en las que se construyen y reproducen las desigualdades y discriminaciones. Los centros escolares tienen que ser espacios comprometidos con políticas de reconocimiento, representación y participación; en los que se preste mucha más atención al trabajo con un conocimiento más relevante e interdisciplinar, para entender el mundo del presente, para capacitar a una ciudadanía crítica, con coraje moral para contribuir a construir un mundo más justo, solidario y democrático.
¿Es posible hacer una educación para la diversidad que atienda las realidades del alumnado? ¿Qué entiendes por una educación inclusiva?
Obviamente, si no existe el compromiso con la diversidad no podemos hablar con propiedad de políticas de equidad, de modelos educativos justos, de justicia curricular. Una educación inclusiva es parte de un proyecto político destinado a desmontar la arquitectura de la exclusión y de la desigualdad y, simultáneamente, de autoculpabilidad y autoodio que suele embargar a las personas excluidas.
¿Es útil segmentar el cuerpo y hablar solo de conocimientos sin incorporar elementos para la educación en la gestión de emociones, diversidades corporales, expresiones de género…?
Es un claro y demostrado error. Pero, lamentablemente, con la LOMCE vamos en esa dirección. El ser humano pasa a concebirse exclusivamente como un robot capaz de multitud de conexiones de informaciones, pero, al margen de la emociones, de las relaciones afectivas, de la necesidad de amor y cariño, de apoyo y cuidados a quien los necesita. Corremos el riesgo de recuperar el peligroso dualismo de la razón frente a las emociones. Piensa lo que implica reducir al mínimo y a «marías» áreas de conocimiento como las Ciencias Sociales, las Humanidades, las Artes y la Educación Física. Es precisamente en estas esferas del saber donde aprendemos a desarrollar la empatía y la sensibilidad, a ponernos en la piel del otro, a expresar y canalizar nuestros afectos, a ayudar y apoyar, a no discriminar, a colaborar, a solidarizarnos, a tener valor para denunciar injusticias, a disfrutar y gozar, a valorar desde la igualdad las diferencias y la diversidad, a potenciar nuestra capacidad de amar.
¿Puede la escuela “deseducar”?
Más que “deseducar”, lo que puede y ahora se pretende es educar en otra dirección. Piensa que cuando empezamos a recuperar la democracia, luego de la muerte del dictador Franco, tuvimos que empezar a cambiar radicalmente las metas de nuestro sistema educativo. Por primera vez empezamos a vernos como «ciudadanía», seres que vivimos en comunidad y que, por tanto, somos interdependientes. Es esta asunción de nuestra dimensión de ciudadanía la que nos llevó a modificar contenidos curriculares, adoptar metodologías basadas en la investigación (no en un memorismo autoritario), a aprender a trabajar de manera colaborativa, a construir una educación democrática. Es con este telón de fondo que cobra mayor urgencia la defensa de la educación pública para todas las niñas y niños, no de agrupamientos en colegios-club privados o concertados.
En la actualidad, desde que el propio Gobierno socialista inició cesiones muy importantes en pro de modelos neoliberales, que el Partido Popular aceleró y consolidó aún más, la actual LOMCE era obligatoria, pues lo que este modelo económico, político y social precisa es un nuevo tipo de personas, un ser con un nuevo sentido común en el que el neoliberalismo se vea como el único tipo de sociedad «lógico», «inevitable», «defendible»… y que las alternativas aprendamos a verlas como «riesgos muy peligrosos», «imposibles», o sea, se asuma que esto es lo que hay, que no existen alternativas, que ya llegamos al fin de la historia.
No podemos ignorar cómo se está pretendiendo que los únicos saberes, competencias y valores necesarios son aquellos que necesita el actual modelo de producción, el mercado neoliberal. De ahí que, tanto a través de los organismos internacionales dedicados a comparar y jerarquizar sistemas educativos y, por tanto, países, como a través de las distintas evaluaciones de los aprendizajes del alumnado que realiza el Estado, se valore exclusivamente la formación matemática, en ciencias experimentales, la comprensión lectora y la educación financiera. Un modelo de ser humano que podemos etiquetar, en palabras del Premio Nóbel de Economía Amartya Sen, como «tontos racionales».
¿Dónde queda el alumnado en el actual sistema educativo?
Con la LOMCE creo que queda reducido a seres obedientes que deben estudiar para pasar los tests de las reválidas externas y de las pruebas PISA, PIRLS y TIMSS, y así dejar en buen lugar a nuestro país, a su colegio (para que no lo cierren) y al profesorado (para que no le recorten su salario o lo despidan, como acontece en esos países que tanto sirven de inspiración a José Ignacio Wert).
¿Masificación en las aulas, niñas y niños en situación de pobreza, menos profesorado, menos recursos, aumento de tasas, menos becas. ¿Cómo se puede renovar el compromiso docente en un contexto educativo como el actual?
Es una tarea dificilísima, pero una gran parte del profesorado de la educación pública lo está haciendo, pues los valores, la ética y el compromiso político con los sectores sociales más desfavorecidos obligan a ello. Esas niñas y niños no van a volver a tener los años que hoy tienen. Debemos ayudarles y ofrecerles la mejor educación. Cualquier docente con un mínimo de empatía sabe ponerse en el lugar de ese alumnado con mayores dificultades y sacar fuerzas, tiempo y recursos de donde sea para apoyarles. Lo contrario no nos dejaría dormir.
¿Qué opinión le merece el currículo de Religión recién salido del horno de los obispos?
Entra de lleno en los planes del gobierno del PP de Mariano Rajoy. Refuerza posiciones creacionistas, acientíficas y únicamente defendibles desde posiciones de fe. Una religión imprescindible para conformar mentalidades conservadoras, resignadas, con miedo a arriesgarse, innovar y, lo que es más importante, imposibilitados para analizar el presente con categorías de justicia. Para el tipo de cristianismo fundamentalista que avala la Conferencia Episcopal (no la Teología de la Liberación), por ejemplo, si a una persona la despiden de su trabajo, le privan de un salario decente para vivir, de una jubilación digna, si la impiden estudiar debido a que no se respeta el derecho a la educación… siempre podrán tratar de convencerla argumentando que es una «prueba que te manda Dios», desviando tu mirada de las estructuras política, laboral, económica, educativa… que realmente son las culpables.
¿Qué fue aquello que no le dijeron en la escuela sus profesores y que le hubiese gustado escuchar?
Que confiaban en mí y que me permitían hablar, hacer y equivocarme sabiendo que es así como aprendemos.
¿Puede hacer tres propuestas urgentes que hay que poner en marcha en el sistema educativo para responder a las exigencias sociales?
1. Apostar por la educación pública y diseñar un plan muy detallado a corto y medio plazo para acabar con la educación concertada. Dotar a los centros con más profesorado y más y mejores recursos informativos y didácticos.
2. Abrir un debate público sobre los contenidos y materias obligatorias del sistema educativo.
3. Políticas y planes para la actualización permanente del profesorado en ejercicio.
Y si me permites dos más: creo que deberíamos abandonar las evaluaciones externas comparativistas tipo PISA, que tanto contribuyen a falsear y reducir la educación a un entrenamiento y aprendizaje de trucos para puntuar mejor en los tests.
Considero urgente la necesidad de trasformar la inspección escolar en un servicio de asesoramiento y de evaluación formativa de programas y proyectos curriculares.

Fotos de Jurjo Torres realizadas por el artista Eduardo Castro Bal
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A Universidade da Coruña investiu co grao Doutor Honoris Causa ao profesor Michael W. Apple o día 16 de marzo de 2015.
Laudatio a Michael W. Apple
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Jurjo Torres Santomé
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Universidade da Coruña
. Universidade da Coruña Universidade da Coruña
Reitor Magnífico, Vicerreitoras e Vicerreitores, Autoridades, Profesoras, Profesores, Estudantes, Persoal de Admnistración e Servizos, Cidadás e Cidadaos.
É un grande priviléxio o poder celebrar hoxe este tan importante nomeamento, o maior que unha universidade pode otorgar, Doutor Honoris Causa, ao Profesor Michael W. Apple. Unha proposta que iniciou a sua andaina en 2004 a proposta por unanimidade do departamento de Pedagoxía e Didáctica e da Faculdade de Ciencias da Educación. A demora deste proceso, debida aos fortes recortes aos que someteron as autoridades políticas as universidades públicas, serveu tamém para ver que aquela iniciativa co paso do tempo acadaba ainda mais razóns para chegar a bon término. Xa que, ademais de ver-se incrementados os abundantísimos e sobrados méritos do candidato, serveu asi mesmo para constatar que as suas teorías, análises e investigacións son imprescindíbeis para comprender a historia da educación do século XX e dos anos que levamos do século presente.
Un Doutorado Honoris Causa é unha distinción e agradecemento a unha persoa de especial relevancia e referéncia obrigada, cando menos, nas áreas de coñecemento nas que incide mais directamente a sua obra. Xa que logo, o que eu tentarei facer é xustificar e convencer á comunidade universitária e á sociedade galega de cales son as razóns principais porque se propón esta distinción que hoxe vamos a facer realidade.
Organizo a miña intervención en duas partes:
- Unha breve descrición do contexto educativo, político e social no que a sua obra chega por primeira vez ao Estado Español.
- O grande impacto e relevancia que foi acadando a sua abundante produción intelectual en libros, artigos de revistas, actas científicas, e participación en congresos, conferéncias e seminários, desde a segunda metade da década dos setenta até a actualidade.
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1. O contexto no que entramos en contacto por primeira vez coa obra de M. W. Apple obríganos a facer un mínimo de recuperación da memoria histórica no ámbito da educación, pois o impacto do seu traballo no noso contexto coincide cos primeiros momentos da denominada restauración democrática, logo de catro décadas de cruel dictadura.
No Estado español o fascismo tivo ao mundo da educación tamén no alvo das suas miradas e accións. Foron demasiados os ensinantes asasinados e encadeados e inhabilitados, en especial nos primeiros anos da usurpación do poder polo Xeralísimo Franco. Aí quedou ese durísimo cuadro-retrato que fixo Alfonso Daniel Rodríguez Castelao en 1937 dun mestre morto nunha estrada que están a contemplar dous sofrintes rapaces, coa significativa lenda «A derradeira lección do mestre«; ou o fermoso, mais realista relato «A língua das bolboretas» doutro dos Honoris causa desta universidade, Manuel Rivas, que narra a experiencia educativa do mestre don Gregorio, un claro exemplo da pedagoxía da Institución Libre de Ensinanza, que nos meses prévios ao levantamento fascista é considerado como unha grande ameaza polos falanxistas e gardas civís que veñen a levar a un mestre que o que facía era suscitar a curiosidade e liberdade intelectual e confiar e animar ao seu alumnado.

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O fascismo español xa desde o primeiro momento sabe ben que unha verdadeira educación, dedicada a desenvolver as capacidades e pensamento das persoas, a estimular a sua capacidade de leitura do mundo e intervir activamente na sua transformación, é incompatíbel cos seus ideais de dominar e someter aos seres humanos. Desde o primeiro momento todos os grandes logros do primeiro bienio da República, 1931-1933, o periodo azañista no que se comezaron a levar a cabo grandes reformas que modernizaban realmente o noso sistema educativo, van a sofrir unha completa marcha atrás; en especial o proxecto de construir muitas escolas, dignificar a figura dos ensinantes, mellorar a formación docente e apostar por un ensino científico, humanístico e laico.
Por primeira vez, naqueles anos da República, España estaba na vangarda do pensamento educativo. A Institución Libre de Ensinanza con persoalidades como Bartolomé Cosio ou Giner de los Ríos (un dos seus fundadores en 1876, e cuxo primeiro centenário do seu pasamento celebramos este ano) estaba na vangarda da transformación educativa, o que tamén facilitou un intercambio muito máis rico co pensamento e prácticas educativas que nese momento estaban na vanguarda no resto de Europa e do mundo, por exemplo, con toda o movimento da Escola Nova (Ferriere, Decroly, Montessori, …), ao igual que, por exemplo, coa riquísima e seminal obra de John Dewey. Os grandes pensadores do momento: Fernando de los Ríos, Joaquin Costa, Ortega y Gasset, Antonio Machado, Miguel de Unamuno, Emilia Pardo Bazán, Gregorio Marañón, Juan Ramón Jiménez, García Lorca, Vicente Viqueira … estaban tamén a través da ILE colaborando coa renovación educativa, cultural e social daquela sociedade.
A Dictadura tratará de borrar o seu legado e influencia desde os primeiros momentos que ocupan o poder. E así, por exemplo, nas queimas de bibliotecas que levaban a cabo, os libros da ILE e, en xeral de todo o que lembrase ao novo pensamento educativo, eran tamén alimento do lume.
Esas terríbeis décadas frearon a modernización en todos os ámbitos culturais e, xa que logo, o pensamento educativo acabou rachando con todo ese legado da República, e o conservadurismo mais ráncio acabou sendo a filosofía e modelo educativo a instaurar.
O campo da pedagoxía e dos estudos de maxisterio estiveron, en toda esa longuísima etapa da dictadura, férrea e autoritariamente vixiados polas autoridades fascistas e, moi especialmente polas autoridades eclesiásticas que animaran o levantamento de 1936, e que logo se esforzaron por perpetuar.
Asasinadas, expulsadas e exiliadas aquelas figuras que trataban de modernizar e estender a mellor educación a todas as capas sociais, a teoloxía tomista pasou a coventer-se nas bases «científicas» coas que pensar e actuar en educación. Tradición que durou inclusive até os primeiros anos da democracia restaurada. Nun libro dun insigne catedrático de Didáctica e Organización Escolar, o primeiro catedrático da Universidade Complutense, Arsenio Pacios, publicado en 1981, podemos ler, ainda nese momento da transición democrática, o seguinte parágrafo: «El punto de partida adoptado en este trabajo es el de la doctrina filosófica y psicológica llamada con frecuencia tradicional, es decir, la aristotélica-tomista, según se cultiva en nuestros dias, …, teñido por una actitud no solo espiritualista, sino positivamnete religiosa» (Arsenio PACIOS: Introducción a la Didáctica. Madrid. Cincel, 1980, páxs. 10 – 11). Optei por le-lo porque poida que as novas xeracións estivesen a pensar que estou falando de varios séculos atrás.
Nas catro décadas que durou a «longa noite de pedra«, en palabras do poeta Celso Emilio Ferreiro, os libros de texto, mais tamén os empregados nas Escolas de Maxisterio, eran obxecto de censura tanto política como relixiosa, os famosos «nihil obstat«, eran os avais das autoridades eclesiásticas incluso ao coñecimento científico e, xa que logo, laico.
Ainda que, pouco a pouco, comezaron a entrar libros clandestinos de todos aqueles campos que as autoridades do «movimiento nacional» vixiaban mais de cerca (filosofía, socioloxía, pensamento político, psicoanálise, …), os referidos à educación prácticamente no chegaron até o inicio dos anos 70. Nestas primeiras brechas de resisténcia van ser moi importantes os movimentos e partidos políticos marxistas e tamén os cristiáns que simpatizaban coa Teoloxía da Liberación latinoamericana. É por iste conducto polo que aos estudantes, por exemplo, nos chegaban libros prohibidos como a «Pedagoxía do oprimido» e «Educación como práctica de liberdade» de Paulo Freire. En Cataluña, a través de certa semente que ainda quedaba latente do movimento republicano de renovación pedagóxica Rosa Sensat, foi quizás por onde entraban mais cantidade de obras de interese: os libros de Celestin e Elise Freinet, de Mario Lodi, e de todo o rico movimento de renovación italiano denominado «Movimento di Cooperazione Educativa», incluindo obras de John Dewey como «Educación y democracia», ou «Experiencia y educación».
No reducido número de facultades de pedagoxía que permitira o fascismo, o Opus Dei vai a xogar un papel de control moi forte, tratando de impedir calquera tipo de pedagoxía desviacionista. Mais ao estar compartindo en muitas ocasións espazos coas seccións de psicoloxia e de filosofía, a psicoanálise freudiana, non a da escola Reichiana, e o Conductismo, que supuña naqueles momentos a máxima innovación permitida, facilitou tamén a entrada do conductismo en educación, na década dos setenta. O ensino programado e a programación por taxonomías de objectivos operativos, eran as maiores novidades naqueles anos, e até ben entrada a década dos oitenta. Ainda que anos mais tarde, da man do discurso das competéncias volta a reaparecer, mais con novas linguaxes.
Sen embargo, as luitas que desde os sindicatos e partidos de esquerda e nacionalistas se levaban a cabo contra a dictadura, tamén tuveron a sua marca na educación. Numerosos mestres e mestras e estudantes universitarios das carreiras de educación, participaban nelas e, o que é mais importante para o que agora nos trae aquí, tamén estas luitas tiñan como obxectivo convencer e animar ao profesorado a «modernizar» o seu pensamento, a suas pedagoxías.
Os libros clandestinos cos que o alumnado confrotábamos ao noso profesorado incluían autores proibidos pola censura franquista: por exemplo no campo da filosofía, textos de Erich Fromm, Hebert Marcuse, Theodor Adorno, Karl Marx, etc. e na educación: Ferrer i Guardia, Paulo Freire, Lorenzo Milani, Neill, Freinet, Ivan Illich, … Eran e seguen a ser autores de referéncia, ainda que na actualidade as modas consumistas e as estratéxias de desmemorización pretendan convencer-nos de que todo aquelo que non se publica na semana anterior pareza como desfasado.
A morte do dictador en 1975 abriu a posibilidade de novas universidades en todo o Estado Español, e desta forma o controle da ortodoxia formativa do profesorado, en especial nas ciencias sociais, se lle fixo muito máis difícil a quen pretendese frear a luita tamén pola liberdade de pensamento.
E foi precisamente a ampliación dos estudos e cátedras de filosofía, socioloxía, economía, así como na nosas faculdades de todas as áreas de coñecimento, o que -a medida que estas ian crescendo e precisando de mais docentes- posibilitou unha maior liberdade de pensamento e pluralidade, e debates mais rigorosos e críticos. O profesorado mais novo, recén saído das facultades, era consciente de que precisábamos tanto de reconstruir a nosa historia de pensamento como, moi especialmente, atualizar os nosos modelos, teorías e pensamento.
Nesta importante tarefa desempeñou un papel de enorme importancia a área de socioloxía da educación e, si un nome é preciso non esquecer é a valiosa obra do primeiro catedrático de Socioloxía da Educación da Universidade Complutense, Carlos Lerena Alesón, que por desgracia faleceu demasiado xoven. A sua obra nos abriu os ollos aos pedagogos e pedagogas máis novos sobre os modos inxustos que o sistema educativo estaba a reproducir e, o que era pior, a lexitimar a estruturación da sociedade en clases sociais. Eran momentos nos que a pedagoxía oficial, a que trataba de continuar as tradicións tomistas e, incluso, o mais rancio conservadurismo, chegaba incluso a equiparar socioloxía e economía con marxismo.
Foi moi importante esta toma de conciencia do profesorado máis xoven co marxismo e, lóxicamente, coas luitas sociais que naqueles anos se estenderon por todo o Estado español para forzar e conquistar unha democracia que Francisco Franco deixara dito aos seus herdeiros que non deberían permitir.
Nas facultades e titulacións de educación era moi constatábel un grande dinamismo e debate que trataba de actualizar e modernizar a nosa formación. As novas correntes pedagóxicas, sociolóxicas, psicolóxicas e filosóficas eran investigadas e procuradas, -aproveitando a posibilidade de viaxar a outros países e realidades- e así confrontar con maior solidez o pensamento e modelos educativos e pedagoxías oficiais, caracterizadas ademais de polo seu autoritarismo, por obrigar a numerosos docentes a converter-se en servís da xerarquia dominante nas facultades universitarias.
O noso compromiso coas luitas sociais e a militancia en organizacións políticas de esquerda nos servía de motor para esforzarnos en trasladar tamén ao noso traballo como profisionais da educación os nosos ideais e compromisos coa democracia; de conformar sociedades e, xa que logo as escolas e faculdades universitarias, en lugares donde rexi-se unha verdadeira igualdade de oportunidades.
É asi como procurábamos con enorme avidez toda clase de libros que consirerábamos podían ser de interese para a nosa actualización e, que inmediatamente, trasladábamos ao noso alumnado. Foi deste modo que autores como Pierre Bourdieu, Roger Establet, Christian Baudelot, Samuel Bowles, Herbert Gintis, Michael F. D. Young, … se convertiron en autores de referencia obrigada para nós e para grande parte do alumnado.
As obras destes autores nos facían conscientes, con dados empíricos incuestionábeis, de que o sistema educativo, o os conteúdos culturais que estudaba o alumnado non eran políticamente neutrais. Nin muito menos! Demasiados estudantes aprendían nas aulas a ver que «non naceran» para estudar, que aquelo non era para eles; non se sentían con capacidades, e os suspensos que recebían como calificacións funcionaban como etiqueta que os debería convencer de que eles eran os únicos responsábeis do fracaso. Os falsos e ideolóxicos discursos oficiais proclamando a existencia dunha igualdade de oportunidades trataban de culpabiliza-los de ser os únicos resposábeis. Liña discursiva que mais recentmente vimos reaparecer da man de persoas como Esperanza Aguirre ou José Mª Aznar co famoso mantra, tan eficaz para a direita e os neoliberais, da carencia da «cultura do esforzo«.
Nese final da década dos 70 e ao longo dos 80 a pedagoxía maioritaria e con poder consideraba que a modernización viña da man dos modelos conductistas, que pasaron a dominar as metodoloxías didácticas e, incluso, a política oficial do Ministerio de Educación: coas famosas taxonomías de obxetivos operativos de aprendizaxe. Non obstante, moi pronto xurdiron alternativas de enorme poder e, nos primeiros momentos de amplia aceitación polo profesorado non universitário, ou sexa, por mestras e mestras e docentes de bacharelato que traballaban en agrupacións moi comprometidas coa modernización educativa, coa xustiza educativa e coa defensa da Escola Pública; o que se denominaron xenéricamente como «Movimentos de Renovación Pedagóxica» (MRPs).
Foi neste sector do profesorado onde as profesoras e profesores universitários máis xoves colaborábamos facilitando o aceso a modelos e obras con enormes posibilidades para modernizar o sistema educativo. Foron moi decisivas as obras de autores como Lawrence Stenhouse, Paul Willis, Stephen Kemmis, John Elliott, Basil Bernstein, a medida que algunhas editoras mais na vanguarda, traducían as suas obras a castelán. Obras que pasaban a converter-se en nutritiva sávia e enerxía para repensar a praxe educativa.
Quero suliñar tamén neste acto o importante traballo de difusión que tiveron tres editorias naquel momento: Paidós, Akal e, moi especialmente Ediciones Morata, que é a que ainda, pese à crise económica, continúa cun forte compromiso ético editorial.
Era grazas a estas empresas que se facilitaba a entrada de novos aires nas aulas das facultades universitarias e no resto das instituicións escolares. Pero tamén é imprescindíbel resaltar a revista Cuadernos de Pedagogía, cuxos 40 anos de existéncia, mes a mes, estamos a celebrar. Revista que o mundo das facultades de pedagoxía, que maioritariamente controlaban sectores tecnocráticos e conservadores acostuman a mirar con sospeita, pero que, polo contrario o resto do profesorado non universitário utilizaba continuamente; unha revista especializada que todavía na actualidade continúa a facer un imprescindíbel traballo en favor da xustiza educativa e da renovación e actualización pedagóxica.
É precisamente neste moi especial contexto que, desde finais dos setenta e princípios dos oitenta, cobra unha importáncia fundamental, e muy decisiva, o noso homenaxeado, Michael Whitman Apple.
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2. O grande impacto e relevancia que foi acadando a sua abundante produción intelectual en libros, artigos de revistas, actas científicas, e participación en congresos, conferéncias e seminários, desde a segunda metade da década dos setenta até a actualidade é algo que merece, cando menos, un acto como este. E máxime nunha universidade que daquela, ainda sendo un Coléxio Universitário dependendo da Universidade de Santiago de Compostela, ao ser un centro de menor tamaño, o profesorado gozábamos de maior autonomía. A nosa universidade podemos contala como unha das institucións pioneiras na introducción das suas obras. Un autor cuxas obras xa a principios dos oitenta tamén traballaba o alumnado.
Frente ao acriticismo intelectual das pedagoxías oficialistas, as suas obras aparecían enormemente provocadoras.
Michael W. Apple é un intelectual, investigador e, porque non dici-lo, un gran amigo cunha historia persoal que condicionou os seus compromisos políticos e intelectuais desde o seus comezos como docente. Liña de conduta que continúa a manter, o que xa é moi digno de suliñar nunha traxectoria tan longa e rica.
Michael W. Apple é un «red diaper baby«, un «bebé de berce e pañal vermello», como el mesmo se define nun dos seu últimos libros, Can Education Change Society? (2013). O seu abó foi un traballador e militante comunista nunha fábrica textil. É fillo duna nai militante comunista e dun pai socialista, oriundos de Polónia, naquel momento Unión de Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS). Lembro unha anécdota na sua casa en Madison, cando ao ensinarme un exemplar do Manifesto Comunista pertencente à sua nai, sorríamos diante da dedicatória: «este libro é propiedade de …».
Membros da sua família viñeron a combatir na guerra civil española contra o fascismo, dentro das xenerosas Brigadas Internacionales. Daí a seleccion dos temas musicais neste acto. Entre as músicas elexidas quixemos lembrar-lle algún dos temas que a sua família escuitaba e, seguro, que tambén cantaban. O resto dos temas teñen que ver con outro dos seus primeiros compromisos políticos, neste caso como activista contra a Guerra do Vietnam.
De neno cresceu nun bairro pobre afro-americano en Paterson, New Jersey. e desde moi cedo pasa a estar comprometido cos movimentos políticos e sociais antirracistas e, lóxicamente co mundo do ensino.
Entre os seus primeiros traballos, ademais de ser empregado nunha imprensa, durante o Servizo Militar (que pese a aducir a sua condición de obxetor, non lle foi aceitada) será nomeado profesor. É así como se inicia nesta profisión en Paterson, New Jersey. O seu activismo político e pedagóxico fai-lle chegar a ser eleito Presidente dun Sindicato de Profesores e Profesoras.
Seguidamente acede a un posgrao na Universidade de Columbia, e en 1970 concluie o seu doutoramento cunha tese de grande impacto: «Relevance and Curriculum: a study in phenomenological sociology of knowledge«. É nese momento no que ademais de entrar en contacto coa obra de persoalidades de referencia mundial naqueles momentos, como Dwyner Hubner, Phenix, etc., asiste a aulas de grandes referentes da Escola de Frankfurt como, por exemplo, Herbert Marcuse, ou Hannah Arendt.
Finalizada a tese acede como docente à Universidade de Wisconsin – Madison e inicia unha brillante, longa e prolífica carreira académica, que continua na actualidade. Alí ocupa unha das cátedras mais prestixiosas, a de Professor John Bascom, no departamento de Curriculum and Instruction and Educational Policy Studies.
No Estado Español, case inmediatamente a publicación (sempre da man das editoas mais prestixiosas) do seu seminal libro «Ideology and Curriculum» en 1979 (e que uns anos mais tarde en 1986 traduce a Editora Akal), chegaron exemplares a España. O seu impacto foi tal que un grande amigo, Mariano Fernández Enguita, daquela profesor na Universidade Complutense, o convidou en 1981 a impartir ao longo dunha semana un seminario. Foi naquel espazo onde por primeira vez entramos en contacto persoal, e partir daí se foi construindo e reforzando a nosa amizade e un fructifero diálogo, ao menos para quen agora lles fala. Pese ao que un imaxinaría, que acudiría tanta xente que non haberia espacio, a realidade foi ben outra, ainda era un grande descoñecido aquí. Un seminario que contou con poucas persoas mais que foi de grande impacto e releváncia para toda unha nova xeración de docentes ansiosos por saber, por coñecer.
Na sua obra, continuaba mais con modificacións moi sustanciosas a liña de pensamento que uns anos antes, en 1971, se iniciara no Reino Unido co libro que compilara Michael F. D. Young, Knowledge and Control, Obra que daria orixe ao que se coñeceu como a «Nova Socioloxía da Educación«. Tratrába-se dun conxunto de textos de enorme trascendencia para o mundo da educación; neles se denunciaban con moi sólidos argumentos os modos como operaba a desigualdade de oportunidades no aceso à educación e, o que era mais importante, de que modo se producía e manifestaba no dia a dia da escolarización.
Frente ao marxismo mais ortodoxo, o neomarxismo, aparece con enormes potencialidades para aprofundar na análise da educación e dos sistemas educativos. Unha da voces máis pronto convertidas en referenia e fonte de autoridade mundial nesta liña de traballo é Michael W. Apple. Ele contribue con grande rigor a desenvolver en esta liña de investigación e análise. Incorpora con gran lucidez e oportunidade o pensamento de Antonio Gramsci e doutro dos autores que constantemente revisita, Raymond Williams. Son referentes cos que fai unhas análises que nos daban muita luz para entender e cortocircuitar as pesimistas teorías da reprodución do marxismo economicista máis ortodoxo.
O conceito gramsciano de hexemonía posto en xogo nas investigacións educativas oferecía enormes posibilidades, que ainda teñen completo valor na actualidade. Aquí aprendimos, muitos de nos, a ver conexions entre intereses de colectivos políticos e das clases sociais máis privilexiadas cos curriculos que veiculizaban a cultura relevante que o sistema educativo trataba de ofecerecer como a «única» e lexítima às novas xeracións.
O seu seguinte libro de enorme impacto, Education and Power, en 1982, e que uns anos mais tarde, en 1987, traduce a castelán a editora Paidós, segue a aprofundar nesa mesma liña de investigación: a problematización do coñecemento presentado como socialmente valioso, e co que a escola traballa.
Na seguinte das suas obras «Teachers and Texts«, en 1986, (tamén en castelán: «Maestros y textos: una economía política de las relaciones de clase y género en educación«. Paidós, 1993) matizan muito mais este sacar a luz a quén pertence ese coñecemento escolar que vehiculan os libros de texto: a quen siléncia, qué relacións se establecen entre este coñecimento e os poderes económicos e políticos dominantes; que empresas están detrás dos libros de texto. E é por iso que nestas obras tamén se presta muita mais atención non só às dimensións de clase social, senon tamén de xénero e raza que até ese momento non ocupan a necesaria atención por parte da investigación educativa realizada por outras autoras e autores.
E será a partir de Official Knowlegde, en 1993, (El conocimiento oficial. Paidós, 1996) e con Cultural Politics and Education, en 1996 (Política cultural y educación. Morata, 1996), que as denuncias contra as políticas conservadoras e neoliberais afloran con maior contendencia; sacando à luz as poderosas estratéxias de controle do «curriculum oficial», o Currículum Nacional lexislado, que os gobernos de Margaret Thatcher, no Reino Unido, e Ronald Reagan, nos EEUU, estaban por primeira vez na história a converter en obrigatório e, deste modo contribuir a conformar un novo pensamento hexemónico neoliberal nas mentalidades das novas xeracións.
A medida que os procesos de globalización neoliberal se acrecentaban, os traballos e libros de Michael W. Apple ian sempre axudando a desvelar como esta terríbel ideoloxía penetraba tamén nas políticas educativas. A través das suas investigacións podemos ver as alianzas que estabelecen os grupos mais poderosos económica e ideolóxicamente; e de que formas as medidas de política educativa que pactan e que se traducen nas lexislacións e normas que impoñen, van contribuindo a sesgar e reorientar as finalidades dos sistemas e níveis educativos; e como sentan as bases para acelerar os procesos de mercantilización tamén nesta esfera da sociedade. Proceos que, por desgraza, no noso contexto se están a acelerar con muita celeridade. Traballos como «Educating the ‘Right’ Way» (2001) («Educar como Dios manda: mercados, estándares, religión y desigualdad«. Paidós 2002) levan un título que deixa ver con claridade o seu contenido. Obra no que se aprofundiza nos modos en que operan na práctica as actuais políticas educativas neoliberais e neoconservadoras que os gobernos impoñen para as instituciónes escolares.
Mais Michael W. Apple tamén soubo desde os primeiros momentos estar atento às resistencias que as clases populares e colectivos docente e profisionais ían manifestando. Presta muita atención às novas potencialidades e mundo de posibilidades que se inciaban coa aparición dos movimentos de mundialización que están a luitar por outro mundo alternativo, mais democrático, xusto e solidario. Segue moi de perto a aparición do Foro Social Mundial no Brasil e desde ese momento trata de aportar tamén todo o seu apoio e colaboración. Pois outra das facetas que acentúa ao principio da década dos noventa é a de tratar de fazer muito mais visíbeis alternativas educativas que se estaban levando à práctica, mais dun modo demasiado silencioso, dada a importancia destas iniciativas.
Un libro que abriu e marcou unha moi rica via de traballo na contribución à visibilización destas iniciativas é o de «Escolas Democráticas» de 1995, e con muitas reedicións. Foi todo un bombazo no mercado editorial. Non somente contou con edicións en castelán, da man de Ediciones Morata, senon que foi traducido aos principais idiomas do mundo. Debe ser raro o lugar a onde esta obra non teña chegado.

Michael W. Apple vai a manter desde os seus inicios como profesor un nítido compromiso de apoio militante a todos os colectivos que sufren calquer tipo de inxustiza, mais tamén con povos e colectivos sociais de países do resto do planeta que están a sofrir persecución ou soportando inxustizas e todo tipo de opresións: políticas, económicas, sociais, de xénero, de etnia, … e, xa que logo, tamén as educativas. Solidariedade e apoio que podemos constatar con só votar una lixeira ollada à sua axenda. Continuamente está a viaxar a moi distintos países e continentes, e sempre disposto a axudar, escuitar, debater e colaborar.
Foi así que logramos a sua importante colaboración para impartir a conferencia de clausura do I Congreso Internacional de Didactica «Volver a pensar a educación», que organizamos desde esta universidade e a colaboración da Fundación Paideia. Un moi importante evento celebrado no recén estreado Palacio da Ópera da Coruña, con arredor de 60 ponentes extranxeiros de primeira liña e outro número semellante de profesoras e profesores das universidades do Estado Español, das área de filosofía, socioloxía e pedagoxía. Congreso con mais de 900 personas asistentes. Os dous volumes cos textos das ponencias, que editou Ediciones Morata, son unha mostra permanente do traballo que neste congreso se desenvolveu. Con posterioridade voltou uns anos mais tardes a impartir un seminario e unha conferencia na nosa universidade e con bastante asiduidade nos atopamos con él en congresos, seminarios, ciclos de conferencias en numerosas ciudades do Estado Español.
A sua inxente produción intelectual, con muitas das suas obras traducidas a múltiples idiomas e divulgadas en todos os continentes, fan que continuamente sexa convidado a impartir cursos, conferéncias, e a participar en numerosas universidades de todo o mundo, como conferenciante principal en congresos e seminarios internacionais e, asimesmo, recebir numerosas e moi prestixiosas distincións. A título de exemplo, pois esgotaríamos muito tempo lendo o seu currículum, podemos salientar os seguintes Doutorados Honoris Causa por institucións tan prestixiosas como a
* Universidade de Londres, Instituto de Educación;
* A Universidade McGill no Canadá;
* Universidade de California (UCLA), nos Ángeles;
* Universidade de Rosario, na Arxentina;
* Universidade de La Pampa, na Arxentina;
Así como noutras prestixiosas universidades en China ou en Australia.
En síntese, é un dos investigadores fundamentais do movimento que se ven denominando como «pedagoxia crítica«. Nas suas obras podemos atopar sólidos argumentos para axudar-nos a facer frente ao actual maremoto que está a provocar o neoliberalismo.
Michael W. Apple foi nomeado un dos 50 autores máis influentes en educación no século XX. E o seu libro Official Knowledge foi seleccionado como un dos libros máis importantes do século XX nas Ciencias Sociais, segundo a International Sociology Association.
E, persoalmente ainda matizo mais. Si, sinceiramente tive-se que elexir as dez personas que para min serían as principais persoalidades do pensamento educativo do século XX, hai dous nomes sobre os que non teria ni a menor dúvida: John Dewey e Michael W. Apple.
Nestos días a biblioteca da facultade de Ciencias da Educación ten unha exposición con obras suas que hai no seu fondo bibliográfico e podo dicer-lles que anda no meio centenar de libros, sen contar o grande número de artigos de revista que tamén poseemos a disposición da comunidade universitaria.
En consecuencia, diante da reducida exposición a que motivos de tempo obriga esta presentación, penso que o Doutor Michael W. Apple é merecente do Doutorado Honoris Causa pola Universidade da Coruña.
Muitas grazas.
c.
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Conocimiento para aprobar
Jurjo Torres Santomé
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Cuadernos de Pedagogía
Nº 454, Sección Historias mínimas, Marzo 2015, pág. 8
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La comprensión de la realidad condiciona el modo de ser y de actuar. Las interpretaciones de un problema determinan vías de acción y soluciones. De ahí la importancia de problematizar los contenidos curriculares en educación. Pero si hay una temática secuestrada por el Gobierno del PP es ésta. La prioridad dada a las necesidades del mercado lleva a primar el lenguaje de las competencias, el emprendimiento y a favorecer las dimensiones utilitaristas del conocimiento; los saberes para estimular el consumismo y los negocios. Se obsesiona a docentes y alumnado con conocimientos y destrezas que pueden generar más riqueza económica a corto plazo, pero sin atender a sus efectos colaterales; por ejemplo, su contribución a la sostenibilidad, a políticas y prácticas de mayor justicia social, económica, afectiva y política.
El debate de los contenidos aparece para mucha gente como innecesario, pues el peso de la tradición convierte en lógico y obvio lo que son opciones selectivas, no desinteresadas.
El mayor interrogante del alumnado a principios de curso no es tanto qué contenidos y con qué metodologías y recursos vamos a trabajar, sino cómo va a ser la evaluación. A partir de ahí todas sus estrategias y tareas van encaminadas a esa meta: aprobar. Pero ahora, con las nuevas políticas de recentralización y control que establece la LOMCE, mediante los nuevos decretos de contenidos que impone el Ministerio, regulando minuciosamente objetivos, conocimientos, competencias, criterios de evaluación, estándares de rendimiento y resultados de aprendizaje evaluables, es muy probable que el qué se evalúa y cómo en las reválidas externas acabe también por convertirse en motor de los dilemas y toma de decisiones del profesorado. Educar se reduciría a entrenamiento para pasar tests y para ocupar los mejores lugares en los ránkings escolares.
Estamos ante el peligro de una mayor proletarización del conocimiento y de favorecimiento de desaprendizajes en aquellos ámbitos con mayor poder para educar y conformar una ciudadanía crítica, reflexiva, informada, solidaria y democrática.
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Édouard Manet – «As bolas de sabão» (1867)
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Educación pública versus clubes educativos
Jurjo Torres Santomé
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Cuadernos de Pedagogía
Nº 453, Sección Historias mínimas, Febrero 2015, pág. 8
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Vivimos tiempos con constantes trabas para frenar la solidaridad y la defensa de derechos comunes. En esta lógica, se incentiva separar a los diferentes colectivos en el sistema educativo para que aprendan a ignorarse y a no verse como iguales. Conformar personalidades empresarias de sí mismas conlleva asumir que no podemos construir relaciones de colaboración, solidaridad y empatía, pues entre empresarios solo hay intereses.
Se eliminó el conocimiento de los derechos humanos y de lo que conlleva el ejercicio de la ciudadanía. Algo lógico si lo que se pretende es erigir una sociedad atomizada, procurando cada uno sus propios intereses; una comunidad de ciegos conformistas, sin esperanza, tratando de sobrevivir, cual la que nos relata José Saramago.
La educación privada y concertada dificulta al alumnado verse como interdependiente, pues los procesos de exclusión, de construcción de jerarquías injustas se llevan a cabo con menos resistencias en el marco de escuelas-club, en las que los iguales comparten y refuerzan sus intereses y necesidades como grupo.
La razón de ser de la red pública es ayudar a verse como seres que en un marco de pluralidad y de democracia aprenden a escuchar, debatir y colaborar con quienes piensan de otra manera; que ven la necesidad de asegurar derechos conquistados y de luchar por otros todavía no traducidos en leyes, pero que están en las agendas de las luchas sociales por otro mundo más justo, democrático, fraternal y solidario.
La cultura del “sálvese quien pueda” se reproduce rompiendo la posibilidad de conocer al otro, de convivir, disfrutar, trabajar y pensar juntos. Cimentar culturas de solidaridad y de justicia es imposible escolarizándose en aulas-parcela según clase social, etnia, sexo, religión, capacidades…
Es urgente ayudar a la ciudadanía a ver el verdadero significado de la educación pública. Lo contrario es apostar por una sociedad de escuelas-clubes que rivalizan entre sí para ganar, cueste lo que cueste.
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Hung Liu – «Sister Hoods» (2003)
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El pueblo palestino en los libros de texto de Israel
«El pueblo palestino en los libros de texto de Israel». Entrevista a Nurit Peled-Elhanan (2012)
Nurit Peled-Elhanan es profesora en la Facultad de Educación en la Universidad Hebrea de Jerusalén, y premiada en 2001 con el Premio Sajarov, que otorga el Parlamento Europeo, por su defensa de los Derechos Humanos y la libertad de pensamiento. En este documental habla de su investigación relacionada con el contenido de los libros de texto de Israel. Pone de manifiesto la finalidad y el modo de construir estos materiales informativos y didácticos. El análisis de contenido de estos libros nos permite constatar su discurso colonialista y racista. En ellos se presenta y manipula la realidad del pueblo palestino con el fin de convencer a la juventud israelí de que son una amenaza, de la ilegiimadad de las reivindicaciones y denuncias que ese pueblo realiza.
PELED-ELHANAN, Nurit (2012). Palestine in Israel School Books. Ideology and Propaganda in Education. London. L.B.Tauris.
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La selección de los contenidos en el currículum básico
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Jurjo Torres Santomé
Cuadernos de Pedagogía
Nº 348 (Julio – Agosto, 2005) págs. 38 – 41
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El diseño de unos mínimos curriculares debería ir precedido por un diagnóstico fidedigno sobre las necesidades de la ciudadanía en el futuro. Una selección de expertos podría elaborar un breve documento de síntesis, punto de partida para un debate amplio en el que, más allá de reivindicaciones corporativistas, quede espacio para la participación de los diversos agentes sociales.
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Plantearse la selección de los contenidos obligatorios del sistema educativo exige asegurar las condiciones que permitirán tomar decisiones de un modo verdaderamente democrático. Desde hace años sabemos que aquí se esconden claves que contribuyen tanto para construir un mundo más igualitario y justo como para seguir perpetuando desigualdades. Decidir una cultura común y básica para toda la ciudadanía significa tener claros los referentes que se consideran valiosos, qué cosas merecen la pena y cuáles no. Sobre la base de procesos de este tipo es como se aseguró y perpetuó durante muchos años la invisibilidad y opresión de las mujeres, de determinadas etnias, de las clases sociales más populares; se impuso la heterosexualidad como norma, un modelo específico de matrimonio, una religión determinada y, en general, se promovieron modelos de vida que sólo eran típicos de los grupos sociales con mayor poder político, económico y cultural. Los procesos de selección e imposición de contenidos culturales también se utilizaron para legitimar ciertos modelos de racionalidad y concepciones de la ciencia, para establecer estándares literarios, musicales y plásticos, etc. Con este tipo de estrategias se facilitó el acceso a determinados conocimientos y se restringió a otros.
La selección de unos determinados contenidos como obligatorios conlleva tomar posiciones sobre cuestiones como las señaladas; por tanto, en una sociedad democrática es imprescindible asegurar fórmulas que garanticen la transparencia de su elaboración y la representatividad de lo seleccionado. Un procedimiento de esta importancia obliga a pensar, al menos, en las cuestiones que siguen a continuación.
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- Qué proceso seguir
Antes de diseñar unos nuevos mínimos curriculares sería importante contar con datos fidedignos acerca de los puntos débiles y fuertes de los que están en vigor; detectar qué lagunas culturales dejan sin cubrir, qué contenidos no se deberían legislar como obligatorios, qué efectos perversos tiene el listado de contenidos tal y como está organizado, qué problemas se le están planteando al profesorado cuando los lleva a la práctica, cómo los vienen interpretando las editoriales de libros de texto, etc. En el sistema educativo español carecemos de una política de investigación educativa dedicada a diagnosticar el éxito, el fracaso o el grado de adecuación de este tipo de medidas de política educativa.
Es preciso ser conscientes de que la decisión de legislar contenidos obligatorios es una tarea compartida con las Comunidades Autónomas, aunque es el Ministerio de Educación y Ciencia (MEC) quien tiene posibilidad de dictar el mayor porcentaje. Así, el Art. 6. 3 del Anteproyecto de Ley Orgánica de Educación especifica que “los aspectos básicos del currículo no requerirán más del 55% de los horarios escolares para las Comunidades Autónomas que tengan lengua cooficial, ni del 65% para aquellas que no la tengan”. Un aspecto clave es si el MEC opta por legislar todo ese porcentaje u opta por no agotarlo, sabiendo además la dificultad que conlleva esta clase de cuantificación, pues nunca se especifica cómo se realiza tal cómputo.
Una cuestión básica que va a condicionar la toma de decisiones es el tipo de ciudadanía que necesitamos para el futuro, algo que ya está implícito en la filosofía y en los objetivos que suelen explicitar las leyes de organización del sistema educativo. Pero será en la concreción de los mínimos cuando se plasmará con mayor claridad. Una decisión tan importante implica establecer los pasos a seguir para implicar a la mayoría de los colectivos sociales, no solo a los relacionados con la educación, pues aquí se deciden cosas muy importantes que afectan a toda la ciudadanía.
Una ayuda en este paso son los informes sobre las finalidades de los sistemas educativos que vienen elaborando organismos internacionales, en los que participa el Estado Español, como por ejemplo, los de la Comisión Europea sobre Competencias Básicas, o de la OCDE, UNESCO y ONU sobre la educación del futuro. Las evaluaciones sobre el sistema educativo, junto con este tipo de informes son un buen punto de partida para promover el debate de los nuevos contenidos a legislar.
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- Quiénes participan
Considero que se debe asumir que la decisión de los mínimos curriculares no debe ser una tarea exclusiva del profesorado. Este colectivo debe ser tenido en cuenta, pero este trabajo excede, y mucho, a sus competencias.
Dado que se trata de buscar el máximo consenso posible entre todos los colectivos sociales, un buen punto de partida sería el de solicitar a personalidades del mundo de la cultura, del ámbito científico, empresarial y sindical, así como del entorno de las ONG, que elaboren un pequeño documento especificando qué deberían saber todos los alumnos y alumnas al finalizar la escolarización obligatoria. Qué conocimientos y valores se deberían fomentar de cara a educar a las nuevas generaciones de un mundo que pretendemos que sea mejor que el actual. Para facilitar el trabajo de estas personas se les podría sugerir que siguiesen algún orden, por ejemplo, les competencias clave que desde las comisiones de educación de la Unión Europea se consideran necesarias para todas las ciudadanas y ciudadanos.
En la selección de estas personalidades habría que tomar en consideración dimensiones como el género, clase social, etnia, sexualidad y creencias de los participantes, para asegurar una mejor representatividad de la diversidad existente en nuestra sociedad. Asimismo, habría que dar prioridad a aquellas personas que trabajan de modo más interdisciplinar, antes que a especialistas de una única disciplina, pues uno de los efectos de la formación y trabajo disciplinar es el de convertirlas en guerreros defensores de tales saberes y, lo que suele ser muy frecuente, en conquistadores de nuevos espacios de ocupación para su propio campo de conocimiento. Todo especialista tiende a considerar su ámbito de conocimiento como el más importante y, al mismo tiempo, a desvalorizar a las restantes especialidades. No tenemos nada más que ver como los distintos departamentos luchan entre sí por más asignaturas y horas en los planes de estudio, así como por más recursos económicos y materiales para impartir sus asignaturas sin, normalmente, ponerse en la perspectiva de las demás áreas de conocimiento. La disciplina “disciplina la mente” y dificulta ver la realidad a través de otras lentes.
Una mirada a la prensa, en especial en los momentos en los que se discuten reformas en los planes de estudio, nos permite constatar con facilidad este tipo de reivindicaciones corporativistas. Especialistas de griego, latín, informática, economía, psicología, antropología, geología, nutrición, sexología, derecho, etc. acostumbran a dejar constancia de lo indispensables y urgentes que son sus saberes y, por tanto, de la necesidad de puestos de trabajo en todos los niveles del sistema educativo.
Seguidamente, una comisión independiente del MEC, integrada por especialistas del mundo de la educación y docentes de reconocido prestigio, en la que se encuentren representadas todas las áreas de conocimiento elaborarían un “documento síntesis”, que se pondría a discusión pública durante un determinado periodo de tiempo.
La Administración debería comprometerse a estimular este debate, facilitando los medios materiales y humanos, pero sin interferir en el control ideológico de los trabajos de la comisión. Ésta se encargaría de recoger las propuestas y elaborar una propuesta definitiva para elevarla al MEC.
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- Qué tipos de contenidos
Desde el principio del debate se debería dejar clara la idea de elaborar unos mínimos curriculares, no máximos, como sucede con los todavía vigentes. Es preciso dejar suficiente espacio tanto para que las Comunidades Autónomas puedan contribuir a eses mínimos como, lo que es de vital importancia, que el profesorado recupere espacios de decisión e intervención en la selección de los contenidos culturales con los que va a trabajar en las aulas.
Habría que vigilar para que aparezcan, además de los relacionados con las competencias antes señaladas, cuestiones como:
a) Contenidos que traduzcan la riqueza plurinacional y plurilingüística del Estado Español.
b) Contenidos que reflejen la riqueza cultural de las sociedades del presente: multiculturalismo, feminismo, culturas adolescentes, etc.
c) Contenidos imprescindibles para el ejercicio de la ciudadanía: los Derechos Humanos, de la Infancia, de los Pueblos; el significado de los Sindicatos, de los Partidos Políticos, de las ONGs, de la Constitución y de los Estatutos de Autonomía, etc.
d) Contenidos para participar en el mundo laboral. Conocimientos y destrezas acordes con un mundo de trabajo flexible e incierto; para ser capaz de implicarse en innovaciones y para trabajar en equipo.
f) Contenidos de claro compromiso con el medioambiente.
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- Cómo organizarlos.
Si queremos que el trabajo escolar le resulte al alumnado mucho más relevante y significativo que en la actualidad, habría que optar por estructurar los contenidos, así como el trabajo en las aulas, de un modo más interdisciplinar o transversal.
Una fórmula aconsejable sería establecer los contenidos mínimos sin organizarlos por disciplinas o, como mínimo, hacerlo por áreas de conocimiento; nunca por asignaturas.
Es conveniente no olvidar que la existencia del Diseño Curricular Base (DCB), con un listado tan excesivamente sobrecargado de contenidos, acabó por desviar las miradas del profesorado, para concentrarse casi exclusivamente en cuestiones metodológicas, de evaluación y de disciplina. No olvidemos, además, que estos listados apenas son leídos por el profesorado que, en muchas ocasiones, se entera de ellos indirectamente, a través de los materiales didácticos que se encargan de su traducción práctica en las aulas: los libros de texto. En consecuencia, la reflexión y toma de decisiones consecuente acerca de qué contenidos culturales enseñar y trabajar en las aulas y, en especial, por qué razones, es algo que muchas profesoras y profesores piensan que no es necesario realizar, pues de eso se encargan el Ministerio y las Editoriales.
Este exhaustivo listado de contenidos de que se compone el DCB, organizados por asignaturas contribuyó, asimismo, a frenar proyectos curriculares más integrados, propuestas de trabajo más interdisciplinares, lo que incide directamente en la motivación del alumnado para implicarse en las tareas escolares. El actual DCB funciona sobre la base de obsesionar al profesorado por conseguir que sus estudiantes dominen todos los contenidos que allí se especifican; algo realmente muy difícil de lograr, dada la amplitud de lo legislado. Una de las salidas por las que se suele optar con mayor frecuencia, y que se puede comprobar revisando la inmensa mayoría de los libros de texto, es la de enseñar tales contenidos con una notable superficialidad. Analizando estos materiales curriculares podemos detectar la vuelta a una especie de memorismo nominalista, mediante el que se exige al alumnado que se esfuerce en recordar nombres, fechas, fórmulas, conceptos y teorías, en lugar de estimular su comprensión, análisis, juicio crítico, aplicabilidad, inferencias, las conexiones con otros conocimientos ya aprendidos, o que se están trabajando, de un modo más o menos simultáneo, en otras asignaturas del curriculum. Muy lejos queda aquel lema y filosofía que hizo famoso la UNESCO en los años setenta: aprender a aprender.
Un objetivo prioritario de cualquier política educativa democrática debe ser confiar en el profesorado, estimulándolo e incentivándolo para que diseñe proyectos curriculares de centro y de aula coherentes con el ámbito familiar, vecinal y local del alumnado. Es imprescindible que las políticas de decretar mínimos curriculares obligatorios no anulen la autonomía de los centros y del profesorado, lo que obliga a dejarle espacios reales para tomas decisiones acerca de qué enseñar y porqué. De lo contrario lo que suele acontecer es que el colectivo docente acaba convertido en un conjunto de marionetas cuyos hilos manejan las editoriales y diseñadores de los libros de texto.
La legislación de los mínimos curriculares también tiene que dejar espacios para la participación e implicación del alumnado, de las familias y de otras organizaciones vecinales y sociales. Es preciso romper los muros de las aulas, para abrirlas al mundo externo, así como vertebrar en un único proyecto educativo las actividades extraescolares y escolares.
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- Mecanismos de implantación, seguimiento y actualización
Deberán concretarse plazos para revisar los contenidos mínimos legislados. Dado que en el mundo actual se producen continuamente nuevos conocimientos es previsible pensar que alguna cosa que un año se percibe como básica, un par de años más tarde se pueda considerar como no urgente o innecesaria. Tienen que existir momentos de revisión que permitan actualizar lo ya decretado; retirar algunos contenidos para introducir otros que se consideran de mayor actualidad o necesidad.
Una cosa que es preciso evitar es la consideración de los contenidos mínimos decretados como algo a lo que siempre se le pueden sumar más y más contenidos. Un lema que debería regir en las decisiones de la Administración relacionadas con los decretos de mínimos curriculares es que cada vez que se añadan nuevos contenidos, es obligado retirar esa misma cantidad de entre los ya legislados. Durante las últimas décadas pudimos ver como los distintos gobiernos periódicamente encomendaban nuevos objetivos y contenidos a los distintas etapas del sistema educativo, pero sin retirar nunca nada de lo que en ese momento estaba legislado.
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Bibliografía:
European Commission (2002). Key Competencies. Eurydice. http://www.eurydice.org
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Georgia O’Keeffe – Sunrise, 1916
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¡THEMBA! Educar para empoderar
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Jurjo Torres Santomé
Cuadernos de Pedagogía, Nº 452, Enero 2015, pág. 8
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En tiempos en los que el mercantilismo y la cultura del emprendimiento individualista se intentan consolidar como el sentido común hegemónico, los poderes dominantes tratan de instrumentalizar el sistema educativo en esa dirección. Toda una auténtica batería de medidas de la LOMCE son comprensibles con este telón de fondo. Tanto en los contenidos impuestos como obligatorios como en las evaluaciones externas de vigilancia de ortodoxias es visible el intento de conformar imaginarios sociales compartidos de un fuerte individualismo. Esto implica olvidar los éxitos conquistados como sociedad hasta el presente, cuando nos pensábamos como interdependientes.
Obsesionarse con los diagnósticos sobre el sistema educativo y las evaluaciones externas del Ministerio únicamente con las asignaturas que consideran PIRLS y TIMSS en Primaria y PISA en la ESO lleva a etiquetar como importantes solo esas dimensiones cuyo rendimiento se visibiliza: Lectura, Matemáticas, Ciencias experimentales y Educación financiera. Focos que relegan, cuando menos a secundarias, la formación en ciencias sociales, humanidades y artes.
Es en estos últimos ámbitos formativos en los que las personas aprendemos a situarnos en la historia como proyecto inacabado y, por tanto, mejorable; a revisitar nuestro pasado para realizar aprendizajes que nos sirvan para entender y tomar el control democrático de nuestro presente como colectividad. La historia, filosofía, geografìa, literatura, música, pintura, escultura, fotografía, cine, etc. nos proporcionan aprendizajes imprescindibles, también, para encauzar la dirección de los aprendizajes científicos y matemáticos. De lo contrario el futuro nos puede coger, de improviso, con direcciones injustas e inadecuadas sobre esos saberes.
No debemos ignorar que el neoliberalismo contribuye a destruir las tradiciones culturales, saberes y aprendizajes que nos muestran como seres que nos necesitamos unos a otros; a cercenar nuestra capacidad de imaginar. Busca individualizarnos de tal manera que todo aparezca imposible de alterar, como algo lógico, dentro de lo ilógico que es asumir el fin de la historia. Por el contrario, una educación integral, conlleva docentes y estudiantes que viven apasionadamente su compromiso en la construcción de otro mundo mejor, que hacen suya la palabra zulú, THEMBA, «esperanza», o el lema, There Must Be An Alternative, frente al discurso neoliberal encriptado en TINA, There Is No Alternative, que popularizara Margaret Thatcher.
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